Cérebro de roedor usa região da visão para perceber tato
Não é mera força de expressão dizer que os ratos usam seus "bigodes" para enxergar no escuro.
Quando estão nas trevas, os roedores empregam a área cerebral responsável pela visão para examinar objetos, ainda que só recebam informações do sentido do tato.
A descoberta, de um grupo de pesquisadores brasileiros, é o desfecho de mais uma batalha numa guerra científica que já dura décadas.
De um lado estão os especialistas que consideram que o cérebro está mais para um canivete suíço, com subdivisões estanques, cada uma dedicada a uma tarefa, como a visão, o tato ou a linguagem.
De outro se colocam os defensores de uma visão mais "curinga" para o órgão. Para esse segundo grupo, embora algumas áreas cerebrais tenham mais probabilidade de se engajar em determinada tarefa, o órgão funcionaria de modo versátil e colaborativo.
Dependendo do contexto, as mais diferentes regiões cerebrais seriam recrutadas para determinado serviço.
É aqui que entra o estudo de Sidarta Ribeiro e seus colegas do Instituto do Cérebro da UFRN (Universidade Federal do Rio Grande do Norte).
Em artigo publicado na revista científica "PNAS", da Academia Nacional de Ciências dos EUA, eles usam a percepção roedora como mais um argumento em favor do cérebro "curinga".
Como lembram os autores da pesquisa, também assinada por Nivaldo Vasconcelos e Janaína Pantoja, "enxergar" com o tato não é algo novo.
Sabe-se que humanos cegos, por exemplo, têm seu córtex visual (a área cerebral da visão) ativado quando usam o sentido do tato.
Apesar dessa e de outras evidências semelhantes, ainda há quem duvide que mamíferos com todos os sentidos funcionais sejam capazes de usar o córtex visual para processar informações táteis de forma útil para o cérebro.
NO ESCURO
Para verificar isso, a equipe implantou em ratos centenas de eletrodos, para medir a atividade dos neurônios no córtex visual e no córtex somatossensório (área responsável pelo tato).
Coube aos bichos fazer algo que todo rato adora: fuçar no escuro. Eles tinham que identificar objetos que nunca tinham visto ou tocado (uma bola, uma escova, um "ouriço" de metal e um recipiente de comida).
Os pesquisadores usaram os dados de ativação de ambos os conjuntos de neurônios para traçar um perfil do que acontecia na percepção dos objetos no escuro. E verificaram um padrão parecido.
No córtex somatossensório, 55% dos neurônios mudaram sua taxa de disparo diante dos objetos novos, contra 35% das células no córtex visual. Mas, em ambos os casos, pouco mais de 80% dos neurônios mostraram excitação. E mais: para cada objeto, o padrão de ativação nas duas áreas era similar.
Para os pesquisadores, é como se cada região do córtex tivesse um peso diferente para a percepção, mas com ambas contribuindo para o retrato mental dos objetos formado pelos ratos.
INSTITUTO DO CÉREBRO
O Instituto do Cérebro da UFRN, onde trabalham os envolvidos no estudo com roedores, foi criado a partir de um "racha" dos cientistas do Instituto Internacional de Neurociências de Natal, liderado por Miguel Nicolelis.
Entre os motivos da cisão estão desentendimentos sobre uso de equipamentos de pesquisa.
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