Cientistas brigam contra a maré para resgatar fóssil de dinossauro no Maranhão

Indicações de pescador ajudaram os pesquisadores a localizar restos do primo brasileiro dos brontossauros

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São Carlos

Paleontólogos enfrentaram os caprichos da maré no litoral do Maranhão para resgatar das águas os fósseis de um primo brasileiro dos brontossauros. Medindo no máximo 10 metros de comprimento, tamanho modesto para os membros de sua estirpe de herbívoros pescoçudos, o Itapeuasaurus cajapioensis é o mais novo membro da lista de dinossauros do país.

Antes de conseguir analisar em detalhes a anatomia dos fósseis e publicar a descrição oficial deles na revista científica Cretaceous Research, os pesquisadores precisaram trabalhar mais de um mês numa região junto à foz do rio Mearim, perto da baía de São Marcos, que só ficava emersa durante poucas horas por dia, por causa das idas e vindas do mar.

"Uma vez que alguns ossos nas rochas eram expostos, precisávamos estabilizar os fósseis para que não fossem danificados pela maré seguinte", contou à Folha o primeiro autor do estudo, Rafael Matos Lindoso, do Instituto Federal do Maranhão.

 

Para isso, os cientistas amalgamaram arames e uma espuma de poliuretano impermeável, protegendo assim o material fossilizado, que ). 

As chuvas fortes da região, no município de Cajapió, também não facilitaram o trabalho. Foi graças às indicações dadas por um pescador de Cajapió que os cientistas localizaram os restos do monstro.

Lindoso e colegas como Ismar de Souza Carvalho, da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), acabaram recuperando vértebras do dorso e da cauda do dinossauro maranhense. 

Isso bastou para que reconhecessem que se tratava de uma espécie nova para a ciência, já que detalhes desses ossos variam bastante entre os saurópodes, como são conhecidos os dinos quadrúpedes, de pescoço longo e herbívoros que dominavam a fauna da América do Sul naquela época.

Para ser mais exato, a espécie recém-descrita pelos pesquisadores pertence ao grupo dos rebbachisaurídeos, bichos que tinham pescoços relativamente curtos (para saurópodes, bem entendido) e estavam adaptados a devorar vegetais que cresciam mais perto do solo.

Tais bichos eram os últimos sobreviventes de uma linhagem mais ampla, que incluía os brontossauros e diplodocos da América do Norte, bem mais antigos, assim como primos distantes na Argentina. 

Por enquanto, o Maranhão é o único lugar do Brasil onde esse grupo foi encontrado —uma outra espécie da região, o Amazonsaurus maranhensis, foi descrita na década passada. 

Em outras áreas do país, os paleontólogos acham apenas fósseis de um grupo bem diferente de dinos pescoçudos, os titanossauros, caracterizados pela presença de calombos ósseos em seu couro.

Se a diferença entre as faunas de pescoçudos não for apenas algo aparente, gerado pelos acasos da preservação de fósseis e das escavações, mas algo que de fato reflete a biodiversidade da Era dos Dinossauros, pode ser que tenha existido alguma barreira entre os bichos, ou adaptações especiais dos grupos que favoreciam sua presença exclusiva em cada uma das regiões do Brasil pré-histórico.

É algo que ainda precisa ser mais estudado, segundo Lindoso. 

De todo modo, sabe-se que também havia rebbachisaurídeos na Argentina, o que indica a maneira complicada como esses grupos se espalhavam pelo mapa da antiga América do Sul.

O Itapeuasaurus cajapioensis viveu numa época em que o futuro território brasileiro já tinha se separado da África, à qual tinha estado ligado como parte do supercontinente de Gondwana. 

Mesmo assim, a nova espécie maranhense de dinossauro tem parentesco mais próximo com bichos da Espanha e da África do que com seus primos da Argentina.

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