Cocô cúbico e o prazer de se coçar estão entre vencedores do prêmio Ig Nobel

Sátira do Nobel, prêmio é dado a pesquisas que fazem rir; vencedores ganham 10 trilhões de dólares do Zimbábue

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São Paulo

Por que os vombates, simpáticos marsupiais australianos, fazem cocô cúbico? A solução para o pontiagudo mistério, que envolveu a análise minuciosa do intestino dos animais e de seu conteúdo, recebeu o prêmio Ig Nobel deste ano na categoria de física.

A láurea, concedida pela revista de humor científico Annals of Improbable Research (Anais da pesquisa improvável), é uma sátira ao Prêmio Nobel. Mas engana-se quem pensa que os cientistas ficam chateados ao recebê-la.

“É uma grande honra ser reconhecido por isso. [O prêmio] estimula o interesse das pessoas pela ciência e traz reconhecimento a um animal que enfrenta ameaças de atividades humanas, o que justifica o esforço de conservação”, diz à Folha Scott Carver, da Universidade da Tasmania, na Austrália.

A ideia de explicar o cocô cúbico apareceu durante um jantar, conta a pesquisadora Ashley Edwards, que trabalha com Carver.  “Estávamos conversando sobre o formato cuboide do cocô dos vombates durante o jantar, o que pareceu algo perfeitamente normal naquele momento, e nós começamos a pensar como deveriam ser organizadas as camadas de músculo intestinal para que os cubos fossem produzidos.”

David Hu, do Instituto de Tecnologia da Georgia (EUA), diz que o próximo passo é descobrir como os animais se comunicam uns com os outros por meio das fezes cúbicas. 

A pesquisa pode ter aplicações médicas: “Quando há doenças no cólon, propriedades físicas do órgão podem mudar, e isso pode mudar a forma das fezes. Talvez médicos ou veterinários possam dizer algo sobre a saúde de um animal se virem bordas angulares ou faces planas nas fezes”, especula.

Na categoria biologia do prêmio, Tomasz Paterek e colaboradores estudaram o efeito de magnetização em baratas vivas e mortas, também com possível aplicação prática.

“Baratas são adequadas para a pesquisa: elas são fáceis de manusear, têm o tamanho e a massa perfeitos e são fáceis de se adquirir”, diz Paterek, da Universidade Tecnológica de Nanyang, em Singapura.

Depois de decifrar como organismos conseguem se comportar frente a campos magnéticos, será possível construir pequenas bússolas e sensores magnéticos inspirados nesses mecanismos biológicos.

Silvano Gallus, do instituto italiano Mario Negri, é o vencedor da categoria medicina. Ele observou que a presença de pizza na dieta pode ser um bom indicador de saúde —na Itália.

“Estou honrado em receber esse prêmio bizarro porém importante. Na verdade, os resultados são muito relevantes, uma vez que haja a interpretação correta: a pizza na Itália pode representar um indicador geral da dieta no país, que, como outras dietas mediterrâneas, já mostraram benéficos para a saúde, como menos risco de câncer intestinal e infarto.”

Os vencedores do Ig Nobel ressaltaram o papel do investimento público em ciência e pesquisa. 

“Financiamento público de pesquisa é de suma importância para o sucesso científico de um país. Quando um país corta o financiamento para a pesquisa, ele vai ficar para trás no fim em relação a seus competidores”, diz Fritz Strace, que ganhou o Ig Nobel de psicologia por sua hipótese, que não perseverou, de que um sorriso forçado com o auxílio de uma caneta no rosto poderia trazer felicidade.

“Se o Reino Unido sair da União Europeia, nós não vamos ter acesso ao fundo de pesquisa de € 30 bilhões para o qual todos os Estados-membros contribuem”, diz Francis McGlone, professor de neurociência na Liverpool John Moores University, ganhador do prêmio Ig Nobel da paz por estudar o prazer de coçar uma coceira.

“É fascinante para um neurocientista estudar os mecanismos por trás da coceira e quão devastadora pode ser a coceira crônica para os pacientes”, diz.

Confirmaram participação na cerimônia de entrega alguns ganhadores do Nobel (o de verdade): Eric Maskin (economia, 2007), Rich Roberts (fisiologia ou medicina, 1993), Marty Chalfie (química, 2008), e Jerome Friedman (física, 1990).

Os vencedores, em dez categorias, receberam uma nota de dez trilhões de dólares do Zimbábue (sem valor monetário). O prêmio, já em sua 29ª edição anual, é dado na Universidade Harvard, em Cambridge, e os vencedores, que bancam suas próprias despesas de viagem, promovem seminários para difundir o conhecimento científico para o público geral nos dias seguintes.

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