Descrição de chapéu drogas

Relação dos seres humanos com a maconha é tão antiga quanto a agricultura no Oriente

Origens da Cannabis sativa remontam à China de 12 mil anos atrás, aponta análise arqueológica da planta

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São Carlos (SP)

As origens da maconha (Cannabis sativa) remontam à China de 12 mil anos atrás, fazendo com que a relação entre os seres humanos e a planta seja tão antiga quanto a própria agricultura no extremo Oriente.

A conclusão está num estudo feito por pesquisadores asiáticos e europeus, o qual sugere ainda que a Cannabis, de início, foi domesticada como vegetal polivalente, sendo usada tanto como alimento e matéria-prima têxtil quanto para fins medicinais e recreativos.

A equipe liderada por Guangpeng Ren e Luca Fumagalli, do Laboratório de Biologia da Conservação da Universidade de Lausanne, na Suíça, acaba de publicar esses achados em artigo na revista especializada Science Advances. A dupla coordenou o sequenciamento (grosso modo, “leitura”) do DNA de 110 variedades da planta oriundas da Europa, da Ásia e das Américas, o que lhes permitiu montar uma grande “árvore genealógica” da Cannabis (veja infográfico).

“O leste da Ásia é reconhecido como um centro de domesticação para muitas espécies de plantas, como o arroz, o milhete, o pêssego e o damasco”, explicou Fumagalli à Folha. Tudo indica que a adaptação inicial da C. sativa para o uso dos seres humanos aconteceu na primeira leva dessas domesticações. Trata-se da fase conhecida como Revolução Agrícola, quando foram lançadas as sementes do crescimento populacional e da complexidade social que caracterizaria a civilização chinesa.

A domesticação da planta aconteceu de forma tão intensa que hoje não restam parentes próximos da maconha na natureza. Embora algumas variedades da planta hoje cresçam em condição feral (ou seja, selvagem), a análise do genoma delas mostra que elas são formas domesticadas que acabaram escapando para a natureza, mais ou menos como os cavalos que povoavam os pampas do Rio Grande do Sul, do Uruguai e da Argentina na época colonial.

Os dados arqueológicos mais antigos sobre a planta vêm de seu uso têxtil, na fabricação de cordas, por exemplo (nesses casos, ela é conhecida como cânhamo), na China e também no Japão, a partir de 7.500 anos. No entanto, isso não indica necessariamente que essa utilidade da planta foi a primeira a ser descoberta e que o uso de suas substâncias psicoativas veio depois, diz Fumagalli.

“Com base na nossa análise, deduzimos que uma seleção divergente forte, direcionando as variedades ou para a produção de fibras ou para o uso como droga, começou há aproximadamente 4.000 anos. Isso sugere que, entre o início do cultivo e o começo dessa seleção divergente, 8.000 anos atrás, a Cannabis pode ter sido uma planta multipropósito”, afirma o pesquisador.

O termo “divergente”, empregado por Fumagalli para qualificar o tipo de seleção que produziu as variedades da planta, explica-se também por uma peculiaridade bioquímica da C. sativa. O que acontece é que, no organismo da planta, duas enzimas (grosso modo, “tesouras” bioquímicas) competem pela mesma matéria-prima, o CBGA (ácido canabigerólico).

Uma dessas enzimas leva à transformação dessa matéria-prima em THC, o principal componente psicoativo da maconha de uso recreativo. Já a outra enzima leva à produção da molécula conhecida como CBD ou canabidiol, mais presente nas variedades do tipo cânhamo.

Se as duas enzimas estão ativas, tanto o THC quanto o CBD são produzidos em quantidades modestas. A seleção de variedades a partir de 4.000 anos atrás acabou gerando, de um lado, plantas com a enzima produtora de THC geneticamente “desligada” e, de outro, a plantas com a enzima do CBD desativada.

Essa conclusão, aliás, é um elemento importante para o melhoramento futuro da planta para diferentes usos, em especial os medicinais. Com base na compreensão detalhada de como os genes que contêm a “receita” para a produção dessas enzimas funcionam, deverá ser possível criar variedades de C. sativa com a combinação desejada de moléculas em seu organismo.

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