Cientistas descobrem evidências de uso do tabaco há 12.300 anos, o mais antigo de que se tem notícia

Evidêncas foram encontradas em uma lareira construída por antigos habitantes, no deserto do Grande Lago Salgado

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Will Dunham
Washington | Reuters

Cientistas descobriram evidências de um marco da cultura humana —o mais antigo uso conhecido do tabaco— nos restos de uma lareira construída por antigos habitantes do interior da América do Norte há cerca de 12.300 anos, no deserto do Grande Lago Salgado, em Utah (oeste dos Estados Unidos).

Os pesquisadores encontraram quatro sementes carbonizadas de uma planta de tabaco silvestre entre o conteúdo da lareira, juntamente com ferramentas de pedra e ossos de pato que restaram de refeições. Até agora, o mais antigo uso documentado de tabaco era na forma de resíduos de nicotina encontrados em um cachimbo no Alabama, datado de 3.300 anos atrás.

Imagem mostra dois homens abaixados trabalhando em um sítio arqueológico
Os arqueólogos Daron Duke e Michael Shane trabalham em sítio arqueológico nos EUA que revelou uso do tabaco por humanos há 12.300 anos - Reuters

Os pesquisadores acreditam que os caçadores-coletores nômades do sítio arqueológico de Utah podem ter fumado o tabaco ou talvez mastigado as fibras da planta, pelos efeitos estimulantes proporcionados pela nicotina que ela contém.

Depois que o uso do tabaco surgiu entre os povos originais do Novo Mundo, ele se espalhou mundialmente após a chegada dos europeus, há mais de cinco séculos. Hoje o tabaco representa uma crise de saúde pública mundial, com 1,3 bilhão de usuários e mais de 8 milhões de mortes relacionadas ao tabaco por ano, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS).

Imagem em close mostra a mão de uma pessoa aberta mostrando um pedaço de osso
Arqueólogo Daron Duke mostra pedaço de osso encontrado em um síto arqueológico nos EUA - Reuters

"Numa escala global, o tabaco é a rainha das plantas intoxicantes, e agora podemos traçar suas origens culturais diretamente até a Era do Gelo", disse o arqueólogo Daron Duke, do Grupo de Pesquisa Antropológica do Extremo Oeste em Nevada, principal autor do trabalho publicado na revista Nature Human Behaviour na segunda-feira (11).

As sementes pertenciam a uma variedade silvestre de tabaco do deserto chamada "Nicotiana attenuata", que ainda cresce na área.

"Esta espécie nunca foi domesticada, mas é usada por indígenas na região até hoje", disse Duke.

O deserto do Grande Lago Salgado é atualmente o leito de um grande lago seco no norte de Utah. O local da lareira na época fazia parte de uma vasta área pantanosa, de clima mais frio durante o fim da Era do Gelo. É chamado de sítio Wishbone ["osso da sorte"], devido aos ossos de peito de pato encontrados na lareira.

Os vestígios da lareira foram localizados brotando do solo de lama seca, onde o vento remove camadas de sedimentos desde que o pântano secou há cerca de 9.500 anos.

"Sabemos muito pouco sobre a cultura deles", disse Duke sobre os caçadores-coletores. "A coisa que mais me intriga sobre esta descoberta é a janela social que abre para uma atividade simples em um passado não documentado. Minha imaginação vai longe."

Os artefatos encontrados incluem pequenas ferramentas de pedra afiadas para corte e pontas de lanças feitas de um vidro vulcânico chamado obsidiana, usado para caçar grandes mamíferos. Uma ponta de lança continha vestígios de proteínas do sangue de um mamute ou mastodonte —parentes do elefante que mais tarde foram extintos.

"Acreditamos que o tabaco fizesse parte da base de conhecimento ecológico dos que se estabeleceram no interior do continente norte-americano há cerca de 13 mil anos ou mais", disse Duke.

A domesticação do tabaco ocorreu milhares de anos depois em outros lugares do continente, no sudoeste e sudeste dos Estados Unidos e no México, acrescentou Duke.

"Não sabemos exatamente quando o tabaco foi domesticado, mas houve um grande florescimento da agricultura nas Américas nos últimos 5.000 anos. A evidência do uso de tabaco, tanto direta —sementes, resíduos— como indireta —cachimbos— aumenta durante esses tempos, juntamente com a domesticação de plantações alimentares", acrescentou o pesquisador.

Alguns estudiosos afirmaram que o tabaco deve ter sido a primeira planta domesticada na América do Norte, e para fins socioculturais, mais que alimentares.

"Não há dúvida de que as pessoas já estariam pelo menos casualmente cuidando, manipulando e controlando o tabaco muito antes dos incentivos populacionais e alimentares que motivaram os investimentos em agricultura", afirmou Duke.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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