Metano pode ser a chave para detectar vida alienígena em um planeta distante

Pesquisadores demonstraram que a abundância do gás na atmosfera pode ser um sinal persuasivo de vida, no contexto planetário correto

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Will Dunham
Washington | Reuters

Para a humanidade, a descoberta de provas de que existe vida fora da Terra provavelmente não acontecerá de maneira dramática, por exemplo com a aterrissagem de uma espaçonave alienígena do lado da Torre Eiffel em Paris. É muito mais provável que ela ocorra por meio de observações via telescópio de um planeta distante cuja atmosfera contenha produtos químicos indicativos de atividade biológica.

Na última segunda-feira (28), pesquisadores disseram que o metano pode vir a ser o primeiro sinal detectável de vida extraterrestre, caso seja descoberto na atmosfera de um planeta rochoso que orbite na "zona habitável" —uma área nem fria demais nem quente demais para a existência de água em forma líquida na superfície do planeta— de uma estrela semelhante ao Sol.

Os cientistas estão trabalhando para compreender os indicadores de vida —bioassinaturas— que podem estar presentes nas observações de planetas em outros sistemas solares, os chamados exoplanetas, sabendo que telescópios de capacidade cada vez maior em breve estarão disponíveis.

Representação artística do exoplaneta  Kepler-62e, que fica na zona habitável de um sol menor a 1.200 anos-luz da Terra
Representação artística do exoplaneta Kepler-62e, que fica na zona habitável de um sistema solar a 1.200 anos-luz da Terra - Nasa Ames - 28.mar.22/JPL-Caltech/Handout via Reuters

Em um estudo publicado na revista científica Proceedings of the National Academy of Sciences, os pesquisadores demonstraram que a abundância de metano na atmosfera pode ser um sinal persuasivo de vida, no contexto planetário correto. O metano é um importante gás residual na atmosfera da Terra, presente em volume de menos de duas partes por milhão.

Diferentemente de outras potenciais bioassinaturas tais como o oxigênio atmosférico, o metano é um dos poucos gases que poderia ser detectado com facilidade por meio do James Webb Space Telescope, lançado em dezembro pela Administração Nacional da Aeronáutica e Espaço (Nasa) americana e que está sendo preparado para entrar em operação dentro de alguns meses.

"Na Terra, a vasta maioria do metano é produzido pela vida", disse Maggie Thompson, a principal autora do artigo, estudante de pós-graduação em astronomia e astrofísica na Universidade da Califórnia em Santa Cruz.

A maior parte do gás é gerada diretamente pela vida: micróbios produtores de metano em terras úmidas, arrozais ou nos aparelhos digestivos de animais de grande porte. O metano também é gerado por atividades humanas como a queima de combustíveis fósseis, entre os quais carvão e petróleo, que são remanescentes de organismos mortos. A proporção de metano gerado de forma não biológica na Terra é minúscula.

Os pesquisadores apresentaram um argumento triplo em favor do metano como bioassinatura promissora.

"Primeiro, não seria surpreendente que a vida produzisse metano em outros ambientes. Mesmo que a bioquímica da vida alienígena seja radicalmente diferente da que existe na biosfera da Terra, a metanogênese é uma estratégia metabólica óbvia e fácil para qualquer vida baseada em carbono, dadas as fontes de energia provavelmente presentes em exoplanetas rochosos", disse Joshua Krissansen-Totton, coautor do estudo e pesquisador Nasa-Sagan no departamento de astronomia e astrofísica da Universidade da Califórnia em Santa Cruz.

Em segundo lugar, eles disseram, o metano não persistiria por muito tempo na atmosfera de planetas rochosos habitáveis sem um reabastecimento constante, possivelmente por meio de organismos vivos. Na Terra, o metano atmosférico é instável —os efeitos químicos da luz o destroem—, mas existe um reabastecimento biológico constante.

Terceiro, segundo os pesquisadores, seria difícil para processos não biológicos, como o vulcanismo ou as reações químicas em cadeias montanhosas oceânicas e fontes hidrotermais, manter o reabastecimento sem deixar "impressões digitais" indicando que o metano não foi gerado biologicamente.

Os vulcões emissores de gases, por exemplo, liberariam monóxido de carbono em companhia do metano, mas a atividade biológica tende a devorar monóxido de carbono e reduzir sua concentração atmosférica. Assim, eles disseram, processos não biológicos não são capazes de produzir facilmente, em planetas rochosos, atmosferas ricas tanto em carbono quanto em metano, como acontece na Terra, mas com pouco ou nenhum monóxido de carbono.

Imagem térmica mostra a liberação de metano na atmosfera em uma fábrica na Itália
Imagem térmica mostra a liberação de metano na atmosfera em uma fábrica na Itália; o gás é invisível ao olho nu, mas é detectável em câmeras infravermelhas - James Turitto - 10.jun.21/CATF/Handout via Reuters

Os cientistas estão na expectativa de que novas percepções sobre a atmosfera dos exoplanetas serão oferecidas pelo James Webb e outros novos telescópios, examinado a química quando esses planetas distantes passarem diante das estrelas cujos sistemas eles ocupam, da perspectiva da Terra.

O oxigênio, mais abundante que o metano na atmosfera terrestre, é outra bioassinatura potencial. Ele também é inserido na atmosfera terrestre via processos biológicos —no caso, a fotossíntese de plantas e micróbios. Mas o James Webb não terá capacidade de detectar oxigênio.

"O metano não é uma bioassinatura hipotética. Sabemos que a vida na Terra vem produzindo metano por essencialmente toda sua história, e as concentrações atmosféricas de metano podem ter sido elevadas no começo da Terra, antes que houvesse oxigênio na atmosfera", disse Krissansen-Totton.

"Mas é importante apontar que a diversidade de ambientes planetários em outros sistemas é provavelmente vasta, e pode haver outros processos não biológicos de produção de metano que ninguém considerou até agora."

Tradução de Paulo Migliacci

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.