Nobel de Física 2022 vai para estudos sobre física quântica

Premiação é entregue desde 1901 e Albert Einstein já foi um dos homenageados

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São Paulo

O Prêmio Nobel de Física de 2022 foi para três laureados: Alain Aspect, John F. Clauser e Anton Zeilinger. A homenagem foi feita em razão de suas pesquisas em física quântica e as aplicações que suas descobertas podem ter para novas tecnologias.

Os estudos desenvolvidos pelos três pesquisadores envolveram experimentos com fótons emaranhados. O resultado possibilita novos caminhos para tecnologias que são baseadas na física quântica e também abre possibilidades teóricas sobre o campo de estudo.

Thors Hans Hansson, membro do Comitê do Nobel para Física, apresenta os premiados de 2022. Alain Aspect, John F. Clauser e Anton Zeilinger foram homenageados por suas pesquisas em física quântica - TT News Agency/Jonas Ekstromervia - Reuters

A física quântica é a área dedicada aos estudos de minúsculas partículas que formam o universo e as interações que ocorrem entre elas. Um conceito importante para esse campo científico é o estado emaranhado. A ideia é que, quando algo ocorre com uma partícula, o fenômeno também vai acontecer com outras partículas que se encontrem nesse par emaranhado, mesmo que elas estejam muito distantes uma da outra.

Uma comparação seria com uma máquina que lança bolas brancas e pretas em direções opostas. Uma pessoa que está em um dos lados recebe uma bola branca e, então, conclui que a bola da posição oposta foi preta.

Quando essa situação é analisada na ótica da física quântica, a explicação se torna um tanto mais complexa. As bolas seriam as partículas e estariam em um par emaranhado porque, quando alguém recebe uma delas, já pode determinar qual o estado —no caso, a cor— da outra.

No entanto, para a física quântica, antes de lançadas essas bolas seriam brancas e pretas ao mesmo tempo.

As pesquisas de Aspect, Clauser e Zeilinger se inserem nesse complexo campo de investigação sobre o estado emaranhado das partículas. As descobertas ainda têm a capacidade de gerar aplicações práticas da física quântica.

"Tornou-se cada vez mais claro que um novo tipo de tecnologia quântica está surgindo. Podemos ver que o trabalho dos laureados com estados emaranhados é de grande importância, mesmo além das questões fundamentais sobre a interpretação da mecânica quântica", afirmou Anders Irbäck, presidente do Comitê Nobel de Física.

Anton Zeilinger nasceu em 1945 na Áustria. Ele estudou o doutorado na Universidade de Viena e, no momento, é professor no mesmo centro acadêmico.

As pesquisas desenvolvidas por ele e reconhecidas agora no Nobel são sobre teletransporte quântico. Em 1997, ele e seu grupo de pesquisa foram pioneiros e demonstraram por experimentos que, quando duas partículas em estado emaranhado viajam em direções opostas e encontram outra partícula, essa última, juntamente com suas propriedades, são assimiladas no sistema quântico. Esse fenômeno que se chama de teletransporte quântico.

Um ano depois, o grupo de pesquisa foi mais longe, com objetivo de trabalhar com pares separados de partículas. Cada par tinha suas respectivas partículas que estavam em estado emaranhado. Então, os cientistas fizeram uma partícula de um par encontrar com a partícula do outro par. Isso fez com que as outras partículas que não tiveram contato uma com a outra entrassem no estado emaranhado, já que seus pares estavam conectados no sistema quântico.

A descoberta é importante porque pode ser um meio para a comunicar a configuração de uma partícula para outra. "É um jeito de transmitir informação", afirma Antonio Vidiella Barranco, professor do IFGW (Instituto de Física Gleb Wataghin) da Unicamp.

Barranco explica que o teletransporte quântico pode ser utilizado em tecnologias de criptografia quântica, um modelo de transmissão de mensagens seguras e criptografas que utiliza a mecânica quântica e o conceito de estado emaranhado.

Outro premiado foi o americano John F. Clauser. Ele nasceu em 1942 em Pasadena, na Califórnia. Seu doutorado foi cursado em Columbia, em Nova York. Agora, ele atua como pesquisador físico na J.F Clauser e Associados.

A ideia de Clauser era testar a desigualdade de Bell. Proposta pelo físico John Stewart Bell, essa teoria foi desenvolvida em razão de um debate acerca da capacidade da física quântica de explicar completamente fenômenos.

Álvaro Machado Dias, futurista, professor livre-docente da Unifesp e colunista da Folha, explica que Albert Einstein foi um desses que desconfiava da mecânica quântica. Para Einstein, variáveis ocultas explicariam o fenômeno de correlação entre duas partículas —não seria o conceito de estado de emaranhamento.

Foi nesse contexto de refutação da mecânica quântica que Bell contrapôs essa teoria com a física clássica e concluiu que o resultado de fenômenos físicos eram muito diferentes se fosse explicado por uma ou por outra. É daí que vem o nome desigualdade de Bell: a diferença existente no resultado entre as duas teorias.

"Bell demonstrou matematicamente que isso defendido pelo Einstein não é verdade", afirma Machado Dias.

Então, Clauser fez um experimento com fótons para contrapor de modo empírico a ideia de variáveis ocultas. No teste, os fótons estavam em estado emaranhado e foram emitidos em sentidos opostos. A polarização foi dimensionada e, no fim, o resultado do experimento mostrou-se conforme o que é preconizado pela mecânica quântica.

O experimento de Clauser foi importante para corroborar com explicações e teorias conferidas pela física quântica, como o gato de Schrödinger.

No entanto, brechas ainda existiam no ensaio de Clauser. Então entra Alain Aspect, terceiro laureado no Nobel.

Aspect nasceu em 1947 em Agen, na França. Em 1983, terminou seu doutorado na universidade francesa Paris-Sud. Atualmente, ele é professor na Universidade Paris-Saclay e na Escola Politécnica, ambas também em território francês.

Ele foi responsável por aperfeiçoar o experimento de Clauser de forma a mensurar mais e melhor os fótons registrados no experimento. "O Aspect conseguiu eliminar essa brecha do experimento do Clauser. Foi um passo para frente", afirma Barranco.

Com a melhoria, aquilo que Clauser tinha descoberto foi comprovado ainda mais por Aspect: os resultados do estudo estavam associados diretamente com a física quântica, ratificando novamente a teoria.

O prêmio

Além do reconhecimento que um Nobel confere, os premiados receberão 10 milhões de coroas suecas (cerca de R$ 4,8 milhões). Um diploma e uma medalha também compõem a premiação.

Desde 1901, 115 Prêmios Nobel de Física foram entregues para 218 pessoas. Dentre esses, somente quatro são mulheres.

O início da premiação se deu em razão da morte do químico sueco Alfred Nobel (1833-1896), inventor da dinamite e responsável pelo desenvolvimento de borracha e couro sintético. O cientista registrou, no total, 355 patentes durante toda sua vida.

No seu último testamento datado de 1895, Nobel registrou que sua fortuna deveria ser destinada para a construção de um prêmio —o que foi recebido por sua família com contestação. Depois de seis anos, enfim, o desejo de Nobel foi atendido e o primeiro prêmio foi entregue.

Indicações e escolha dos homenageados

O processo de avaliação para um Nobel de Física começa em setembro do ano anterior à entrega do prêmio. A primeira etapa consiste no envio de aproximadamente 3.000 convites para indicação de nomes que poderiam ser reconhecidos pela homenagem. Os convidados não podem se autoindicar.

Esses convites são endereçados para membros da Academia Real Sueca de Ciências, integrantes do Comitê do Nobel de Física, ganhadores do Nobel de Física, professores de física em universidades e institutos de tecnologia da Suécia, Dinamarca, Finlândia, Islândia e Noruega, e do Instituto Karolinska, em Estocolmo e outros cientistas que a Academia considere adequados para receber os convites.

A instituição também convida professores de pelo menos seis universidades ao redor do mundo. Normalmente, os convites são estendidos para mais centros acadêmicos com o objetivo de assegurar a distribuição adequada de indicações pelos continentes e áreas de conhecimento.

Então, ocorre a análise das centenas de nomes apontados com aplicação de processos, como desenvolvimento de relatórios, para estreitar a seleção. Finalmente, em outubro, a Academia, por votação majoritária, decide quem receberá o reconhecimento.

Entenda a física quântica com o gato de Schrödinger

O que é o gato de Schrödinger?

É um experimento mental feito pelo físico austríaco Erwin Schrödinger. Nele, um gato vivo estaria dentro de uma caixa com partículas radioativas. A vida do animal depende dessas substâncias: se elas circularem na caixa, ele morre; se não, ele continua vivo.

O que o experimento significa?

A proposta de Schrödinger é que o fenômeno seja analisado pela ótica da física quântica. Nesse caso, o gato poderia estar vivo e morto ao mesmo tempo. Nesse campo de estudo, isso é chamado de sobreposição quântica. O conceito exprime que as possibilidades do estado de uma partícula existem simultaneamente até que ela seja medida (ou observada). Ao fazer isso, a partícula mostra-se em somente um estado.

No caso do gato, isso se daria quando a caixa fosse aberta. Até lá, as possibilidades —vivo ou morto— continua existente.

Como isso se relaciona com os premiados pelo Nobel?

O experimento do gato de Schrödinger popularizou a física quântica. Conceitos como sobreposição quântica e estado emaranhado são representados na parábola.

Os estudos homenageados pelo Nobel foram importantes por demonstrarem que a física quântica, um campo ainda repleto de possibilidades de estudo e contestações, pode explicar fenômenos.

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