Alexandre Schneider

Pesquisador do Transformative Learning Technologies Lab da Universidade Columbia em Nova York, pesquisador do Centro de Economia e Política do Setor Público da FGV/SP e ex-secretário municipal de Educação de São Paulo.

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Alexandre Schneider

Por que é um erro autorizar organizações sociais a gerir escolas em São Paulo?

A implantação deste modelo é desvantajosa do ponto de vista financeiro

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Lara Simielli

Diretora de Conhecimento Aplicado do D3e e Professora no Departamento de Gestão Pública da FGV EAESP

Tramita na Câmara Municipal de São Paulo um projeto de lei que prevê a administração de escolas municipais por Organizações Sociais. A justificativa do projeto, de autoria da vereadora Cris Monteiro (Partido Novo), é a de que a cidade já conta com uma rede de creches conveniadas, "organizações sociais que recebem recurso público para gerir o funcionamento dos equipamentos de primeira infância como forma de garantir o acesso público, gratuito e com mais qualidade à população". Com todo respeito à boa intenção da nobre vereadora, não nos parece o melhor caminho.

A implantação deste modelo é desvantajosa do ponto de vista financeiro. Sua eventual adoção implicaria perda de receita ao município, uma vez que o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) não prevê repasse de recursos para escolas conveniadas de ensino fundamental.

O município perderia cerca de R$ 6 milhões anuais por cada escola com mil alunos que conveniasse, além de ter que buscar no seu orçamento o valor a ser repassado ao parceiro. Desta forma, uma escola conveniada custaria no mínimo o dobro de uma escola administrada pela Prefeitura.

Alunos sentados observam professora
Não há evidência científica que a qualidade das creches conveniadas com a Prefeitura de São Paulo seja melhor do que as administradas pelo setor público - Rafael Hupsel - 16.ago.18/Folhapress

Ao contrário do texto da justificativa do projeto, não há evidência científica que a qualidade das creches conveniadas com a Prefeitura de São Paulo seja melhor do que as administradas pelo setor público. Como o modelo de administração privada de escolas públicas de ensino fundamental e médio não foi adotado no Brasil —apenas por um brevíssimo período em uma única escola em Pernambuco— tampouco há evidências de seu sucesso em relação ao das escolas públicas tradicionais.

Há um indicador de resultado de aprendizagem que pode ser utilizado para comparar escolas públicas e privadas: o resultado dos seus estudantes na última avaliação do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (PISA).

Segundo esta, o resultado dos estudantes de escolas privadas e daqueles matriculados nos institutos federais de educação é o mesmo, ou seja, um bom projeto educacional e o nível socioeconômico dos alunos parecem contar mais do que se o modelo de administração escolar é público ou privado. Esse fato, por sinal, é algo que a literatura especializada já consagrou.

No contexto internacional, contudo, há muitos estudos produzidos e publicados em revistas acadêmicas respeitadas. O economista Martin Carnoy (Stanford) e a pesquisadora Lara Simielli (D3e e Fundação Getúlio Vargas) realizaram uma ampla investigação em artigos acadêmicos sobre "vouchers" e "charter schools". O primeiro modelo consiste no repasse de recursos às famílias para que escolham uma escola privada para matricular seus filhos. Já as "charter schools" são escolas privadas financiadas pelo setor público sob regras definidas em um contrato de gestão, que inspira o projeto de lei paulistano.

A revisão dos autores, que englobou mais de 150 estudos artigos acadêmicos sobre o assunto produzidos entre os anos de 2012 e 2021, apontou que o impacto das escolas "charter" é nulo ou muito baixo na aprendizagem dos estudantes quando os resultados são agregados pela rede de ensino. Ou seja, pode-se entender que a competição entre as escolas pode beneficiar alguns alunos de maneira individual, mas não trazem benefícios para a rede de ensino como um todo.

Mais do que isso, a adoção deste tipo de competição entre as escolas aumentou a segregação e estratificação do sistema educacional nos Estados Unidos e na Suécia, o que também ocorreu no Chile com os vouchers.

Não se trata de negar a importância do estabelecimento de parcerias e contratos com organizações do terceiro setor e mesmo com o setor privado. Estes setores contribuem e podem contribuir com a escola pública em várias frentes, mas a adoção destes mecanismos claramente não é uma delas.

Ao invés de adotar políticas que já se mostraram pouco eficientes mundo afora, o ideal seria que nos dedicássemos a ampliar a autonomia das escolas públicas, desenhar carreiras que valorizem o desenvolvimento profissional dos educadores, garantir que os profissionais da educação cumpram sua jornada em uma única escola com salários dignos e a ampliar do controle social sobre os sistemas educacionais. É assim nos melhores sistemas educacionais do mundo. Pode ser assim no Brasil.

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