Alexandre Schwartsman

Consultor, ex-diretor do Banco Central (2003-2006). É doutor pela Universidade da Califórnia em Berkeley.

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Alexandre Schwartsman
Descrição de chapéu petrobras

Discussão sobre combustíveis revela fragilidade do ambiente institucional

Regras existem para dar previsibilidade, e não apenas econômica, para quem vive em sociedade

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Enquanto escrevo, caminhoneiros protestam contra o aumento do diesel, poucos dias depois de o ministro de Minas e Energia, Moreira Franco, afirmar que o governo quer discutir a política de preços dos combustíveis.

Segundo o ministro, “está subindo demais”, aventando a possibilidade de reavaliação dos impostos, além da política de preços da Petrobras. São ambas péssimas ideias, embora possam, como é, infelizmente, comum no Brasil, prosperar ambas.

A origem da questão é o aumento dos preços internacionais de petróleo e derivados. O barril de Brent subiu de US$ 45 para perto de US$ 80 de meados do ano passado para cá, na esteira de problemas geopolíticos (a crise com o Irã), bem como o colapso da produção na Venezuela. A ele se soma a valorização global do dólar, cujas repercussões domésticas analisamos na semana passada.

Nesse contexto, deveria a Petrobras ignorar o ocorrido e manter os preços de derivados isolados dos mercados internacionais? A resposta é um sonoro não, por pelo menos dois motivos.

Do ponto de vista da empresa, essa política seria ruinosa. Não se trata de especulação, mas simples observação dos efeitos destrutivos dessa mesma posição adotada durante o governo anterior para evitar aceleração ainda maior da inflação. Foram anos de perdas multibilionárias para a empresa, R$ 81 bilhões (a preços de 2017), acumuladas entre 2014 e 2016, que contribuíram para transformá-la na empresa de petróleo mais endividada do mundo.

Já do ponto de vista de funcionamento de mercados, há problemas com esse tipo de política. Preços mais elevados de uma mercadoria sinalizam a necessidade de reduzir seu consumo em nome da eficiência econômica. Quando se impede o funcionamento dessa sinalização, o consumo não cede e precisamos entregar mais mercadorias em troca daquela, mercadorias que poderiam ser destinadas à aquisição de produtos que entregassem o mesmo bem-estar, ou ainda mais.

Note-se que essa mesma crítica se aplica a medidas de redução da carga tributária sobre combustíveis fósseis, pois interferem com a reação de mercado. Sim, há sempre a possibilidade de argumentar que a tributação em si já afeta o funcionamento do mercado, mas noto que: 

a) há consequências negativas no uso de combustíveis fósseis (poluição, por exemplo) que não são integralmente capturadas nos preços, justificando em alguns casos a tributação;

e b) uma coisa é discutir o nível correto da tributação de combustíveis, outra, bastante distinta, é alterar impostos para mascarar a flutuação de preços sem maiores ponderações sobre seus efeitos colaterais.

Por fim, muito embora os R$ 5,7 bilhões/ano arrecadados pela Cide representem parcela irrisória (cerca de 0,5%) da receita do governo federal, o quadro fiscal é grave o suficiente para não justificar medidas de renúncia tributária, ainda mais no caso da gasolina, que beneficiaria desproporcionalmente a parcela mais rica da população.

Mesmo que essas propostas não se concretizem, essa discussão é reveladora da fragilidade do ambiente institucional brasileiro.

Regras existem precisamente para dar previsibilidade, e não apenas econômica, para quem vive em sociedade. Se formos discutir mudança de regras em reação a cada evento que nos contrarie, não é difícil concluir que o quadro institucional não é estável.

E ainda há quem procure a razão do baixo investimento no país...
 

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