Alvaro Costa e Silva

Jornalista, atuou como repórter e editor. É autor de "Dicionário Amoroso do Rio de Janeiro".

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Alvaro Costa e Silva
Descrição de chapéu Alalaô

Muito xarope, pouca alegria

Mais que uma festa móvel, o Carnaval é mutante

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Uma enquete nas redes sociais revelou a "madeleine". Minha mais antiga lembrança de Carnaval são oito homens presos, de costas, mãos para trás, perfilados na lateral do Palácio Monroe, Cinelândia. Era sábado e —explicou meu pai— eles só seriam liberados do xadrez na Quarta de Cinzas, ainda a tempo, quem sabe, de seguir para o subúrbio do Engenho de Dentro e pegar o desfile do Chave de Ouro, bloco de sujos famoso por suas escaramuças com a polícia.

O tempo perdido da fantasia tinha como palco a Cinelândia. Nos anos 1960 e 1970, era em seus arredores e descendo e subindo a avenida Rio Branco que se concentrava a multidão de mascarados, e as muitas pessoas que vinham só para ver. Um dia tudo sumiu. No início da década de 1980, o Centro da cidade era um deserto de foliões. Até mesmo o Bola Preta, o gigante de hoje, saía com menos de 20 mil pessoas (cá pra nós, era mais gostoso).

 

Em meados daquela década, tudo mudou de novo. A partir da zona sul (dizem que na zona norte o Carnaval nunca desapareceu, mas é lenda carioca), os blocos voltaram e, em processo semelhante àquele que vive São Paulo atualmente com seus "bloquinhos", não pararam mais de crescer. E incomodar.

Mais que uma festa móvel, é uma festa mutante, embalada em alta tensão sexual. As marchinhas e os sambas continuam, mas dividem a vez com o rock, o pop, o funk, o sertanejo e o gospel. Virou brincadeira engajada, com pegada político-social e lacradora ("Ei, Bolsonaro, vai chupar caju"), discursos sobre igualdade, respeito à diversidade, defesa da democracia. Resumo da ópera: muito xarope, pouca alegria.

Carnaval deve surpreender. Digamos que, no fim da farra, ao entrar no metrô, você encontre a seguinte cena: a ressaca se insinuando no ambiente pesado, no glitter borrado, no esplendor aos pedaços, nos pés feridos, nas caras de sono. Aí, sim, pode ter valido a pena.

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.