No tempo em que, por absoluta falta de assunto, os jornais, as revistas, as rádios e as tevês —ainda não havia os portais de notícias na internet nem os podcasts— faziam enquetes sobre isso e aquilo, Carlos Heitor Cony era sempre procurado para responder quem era o maior carioca de todos os tempos. Sua resposta a princípio assustava, depois encantava: é aquele homem de braços abertos no alto da montanha.
O escritor justificava o voto: se não fosse o maior carioca em conteúdo, ele o seria em forma: 38 metros de altura e 1.145 toneladas. Apesar da dimensão, a estátua de elegante estilo art déco é um prodígio de proporção. Tem exatamente o tamanho que deveria ter e integra-se perfeitamente à paisagem do Corcovado.
O Cristo Redentor, Cony continuava, não só abençoa o Rio como conhece seus segredos, esplendores e misérias e é o primeiro a se encharcar nos temporais. Não é à toa que, ao completar 90 anos, na próxima terça (12), ganha de presente uma reforma na cabeça, uma nova cobertura em pedra-sabão.
Nas comemorações serão lembrados, com maior ou menor razão, os nomes dos escultores Paul Landowski e Gheorghe Leonida, do engenheiro Heitor da Silva Costa, do cardeal Sebastião Leme e até da princesa Isabel, que teria sido a primeira pessoa a idealizar a obra, segundo o jornalista Rodrigo Alvarez, autor de uma recém-lançada biografia sobre o Cristo Redentor.
Eu só consigo pensar no compositor Assis Valente. Em 1941, ele resolveu se matar e escolheu o lado mais perigoso do Corcovado para pular, uma descida de quase 700 metros em direção à parte mais funda da encosta. Sem camisa, o autor de "E o Mundo Não se Acabou" se jogou de costas, mas ficou preso na copa de uma árvore brotada na pedra. Depois de resgatado pelos bombeiros, Assis disse que a última coisa de que se lembrava era uma enorme mão suspensa entre as nuvens e o céu azul. De alguma maneira, alguém o abraçou.
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