Chanchada de 1948 dirigida por José Carlos Burle, "É com Este que Eu Vou" abre com a visão do antigo Ministério da Fazenda, que ocupa um quarteirão da avenida Antônio Carlos com seu pórtico de mármore e colunas de 10 metros de altura. Alheio à imponência, o mendigo Oscarito dorme tranquilamente, inquilino de uma das janelas laterais do edifício, até ser sacudido pelo companheiro Lamparina (Grande Otelo) trazendo a notícia de que ele ficara rico: "Acorda!".
Hoje, quando o Centro do Rio vive tomado por moradores de rua que se ajeitam em qualquer canto, a maloca de Oscarito desfrutaria o status de suíte presidencial dos sem-teto. Mas ninguém mais dorme ali. O prédio da Fazenda, símbolo da Era Vargas, está em reforma há 10 anos, coberto por tapumes duplamente providenciais desde que um pedaço de granito de 20 quilos caiu da fachada.
Em ritmo lento, quase parando, a obra, que mais parece de igreja, consumiu R$ 11,8 milhões e está longe de terminar. Para manter os 14 andares (107 mil metros quadrados) e a vista espetacular da baía de Guanabara, o custo é de R$ 150 mil por mês. Ao contrário do Palácio Capanema, ex-sede do Ministério de Educação e Saúde, o edifício em estilo neoclássico-fascista não entrou no feirão do ministro Paulo Guedes, que ofereceu 2.000 imóveis da União localizados no Rio à iniciativa privada.
Quem supervisiona a reforma são técnicos do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Deve ser a única coisa que está funcionando no Iphan, transformado em órgão fantoche de bolsonaristas. A atual presidente é formada em turismo. O desmonte é feito às claras —conselho consultivo extinto, menor orçamento desde 2018, ausência de editais— e assumido orgulhosamente por Bolsonaro: "Ripei todo mundo".
Pelo jeito, os mármores do velho ministério não entram na categoria "cocozinho petrificado de índio". Os Oscaritos do futuro agradecem.
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