Ana Estela de Sousa Pinto

É correspondente na Europa. Na Folha desde 1988, já trabalhou em política, ciências, educação, saúde e fotografia e foi editora de 'Mercado'. É autora de 'Jornalismo Diário', 'A Vaga É Sua' e 'Folha Explica Folha'.

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Ana Estela de Sousa Pinto
Descrição de chapéu Copa do Mundo

Vergonha de torcer pelo Brasil

Apoiar ou não a seleção brasileira ganhou status de manifestação política

“Não quero dar ao Temer o gostinho de entregar a taça.” 

“Camisa da seleção e bandeira são uniforme de fascista.”

“A Copa foi uma arma da ditadura para alienar as pessoas.”

“Torcer para o Brasil põe mais lenha na fogueira da direita.”

Por aí, saímos todos derrotados.

Torcedor brasileiro mostra bandeira com foto do treinador Tite no amistoso entre Brasil e Áustria, em Viena
Torcedor brasileiro mostra bandeira com foto do treinador Tite no amistoso entre Brasil e Áustria, em Viena - Leonhard Foeger/Reuters

Em tempos normais, o futebol deveria ser um antídoto contra polarizações e unir torcedores das mais variadas convicções, lembrou Joel Pinheiro da Fonseca, economista, filósofo e colunista da Folha.

“Permanece, assim, como um dos poucos elementos comuns a toda a sociedade. Perdê-lo será nos fragmentar ainda mais”, escreveu ele.

Se há algo de que não estamos podendo nos dar ao luxo, porém, é de nos desagregar ainda mais. 

É verdade que a camiseta amarela da seleção é cafona, e a insatisfação pode até ser uma desculpa de alguns para aposentá-la. Mas, como forma de protesto, deixar de torcer para o Brasil na Copa é infantil e inútil, simplesmente porque o silêncio e a inação nunca levam a lugar nenhum. 

Ficar emburrado no seu canto não tira a taça das mãos de Temer, não desarma o fascismo, não desaliena ninguém nem puxa a lenha de volta para a nossa fogueira, seja qual for.

Pior que isso, quem cala consente. Basta olhar na história quantos monstros cresceram sob nosso silêncio até não podermos mais contê-los.

Pelo bem da nossa vida particular e pública, tem que haver outras formas ao mesmo tempo divertidas e enfáticas torcer e marcar posição.

Proponho quatro:

1) Personalize a amarelinha com sua frase preferida de oposição. Por exemplo: “Eu não quero que o Brasil ganhe. Pergunte-me por quê”.

2) Não abre mão do vermelho? Já tem gente ganhando dinheiro com uma versão dessa cor. Mas tem que usar, de preferência, pulando como um louco abraçado a alguém de amarelo às nove da manhã.

3) Como sou goleira, acho a preta a mais linda de todas. E ainda representa o luto pela situação triste em que deixamos o país.

4) Faça como meu amigo Mag e abra os caminhos do discurso em sua rede social: “Vou ver todos os jogos que puder e torcer muito pela seleção brasileira nesta Copa! Prazer e paixão que se renovam desde 1962, minha primeira lembrança do esquadrão de ouro, quando tinha seis anos. E os malas aí vão pentear macaco”. É uma boa forma de começar a recuperar símbolos que julgamos sequestrados por mãos erradas.

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