André Singer

Professor de ciência política da USP, ex-secretário de Imprensa da Presidência (2003-2007). É autor de “O Lulismo em Crise”.

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André Singer

Entre a espada e a parede

É preciso combinar a defesa da democracia com a reativação, por baixo, da atividade econômica

A 15 dias do primeiro turno das eleições, parece provável que caiba a um dos candidatos do campo popular o comando do polo democrático contra a opção autoritária representada por Jair Bolsonaro (PSL, 28% das intenções de voto) na segunda fase. Caso a probabilidade se confirme, tanto Fernando Haddad (PT, 16%) quanto Ciro Gomes (PDT, 13%) terão que conjugar duas necessidades antagônicas. De um lado, a de agregar todos os que rejeitam a volta da ditadura. De outro, romper com o bloqueio neoliberal quanto à política econômica.

Cabe lembrar que a ascensão do postulante de extrema direita corresponde a dupla determinação. Estimulada inicialmente pelo antipetismo que eletrizou vastos setores da classe média a partir de 2013, a candidatura radical não chegaria ao ponto alcançado caso a economia andasse bem.

Jair Bolsonaro em capa da revista The Economist
Jair Bolsonaro em capa da revista The Economist - Reprodução

No numeroso segmento de renda familiar mensal entre 2 e 5 salários mínimos, no qual emprego e renda são os problemas principais, Bolsonaro alcança 34% das intenções de voto (Datafolha, 20/9). 

É verdade que convertido a um ultraliberalismo de ocasião, o programa de Bolsonaro levaria ao resultado oposto do pretendido por tais eleitores. Não obstante, é um voto que passa longe de plataforma. Trata-se, na verdade, de um protesto contra uma casta (Brasília) que roubaria a sociedade (Brasil), impedindo que haja mais postos de trabalho e melhor remuneração.

Assim, a insatisfação com a economia é o pano de fundo que abarca todo o eleitorado popular. Em consequência, para que os comandantes da opção democrática levem a embarcação a bom termo, isto é, possam governar, será preciso combinar a defesa da democracia com a reativação, por baixo, da atividade econômica. 

Aqui, porém, esbarram em conflitos centrais. O debate posto no Brasil é semelhante ao que acontece mundo afora. Como tem se tornado comum depois de 2008, diante das crises, o neoliberalismo em lugar de recuar, se torna mais radical. Considera ser indispensável aprofundar a austeridade para, supostamente, corrigir problemas causados pela própria austeridade. 

Parte dos neoliberais é sinceramente democrática e o seu concurso será relevante para brecar a ascensão dos que flertam com o fascismo à brasileira. A posição da revista The Economist (Folha, 20/9) contra o bolsonarismo, por exemplo, ajuda a conformar o amplo arco que se levanta em favor das liberdades civis.

Simultaneamente, porém, pressionam, por todos os meios e formas, para que os presidenciáveis populares beijem a cruz da “responsabilidade fiscal”, com o que ficariam imobilizados. 

Haverá alguma fresta entre a espada e a parede?

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