André Singer

Professor de ciência política da USP, ex-secretário de Imprensa da Presidência (2003-2007). É autor de “O Lulismo em Crise”.

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André Singer
Descrição de chapéu Eleições 2018

Uma janela para a razão

Cidadão que neste momento deseja sufragar Bolsonaro será sensível ao apelo do cálculo?

Com o início do horário eleitoral gratuito, começará uma das operações mais interessantes desde a redemocratização. Trata-se daquela a ser realizada por Geraldo Alckmin (PSDB) para esvaziar a candidatura de Jair Bolsonaro (PSL), atraindo para si apoiadores do capitão reformado. 

Paradoxalmente, o que mais ajudará o ex-governador paulista na tarefa será a ascensão do seu tradicional adversário, Lula. 

Com quase 40% das intenções de voto, o ex-presidente, mesmo impugnado pela Justiça, tem chance de colocar o vice Fernando Haddad no segundo turno. 

Nesse caso, o eleitor antipetista ficará obrigado a pensar em quem teria mais chances de derrotar o PT na rodada final. E cedo ou tarde perceberá que, sendo o tucano mais moderado que o candidato do PSL, embora, também, nitidamente conservador (diferente de Marina Silva), reúne melhores predicados para o embate decisivo.

Ficaríamos, assim, livres de que uma proposta ditatorial se tornasse a liderança do Brasil.

Mas será que o cidadão que neste momento deseja sufragar Bolsonaro será sensível ao apelo do cálculo? 

Diga-se, de passagem, o caso configura um problema fascinante para o campo que se dedica a estudar o assunto. Nele, sabe-se que a falta de informação, a paixão ideológica, ou até mesmo fatores fortuitos, podem desviar o comportamento individual da racionalidade que a teoria democrática lhe atribui. 

Se para o entrevistado que declara preferência pelo militar reformado o mais importante for infligir uma derrota ao petismo, mudará de opção. 

No entanto, se a escolha refletir um sentimento confuso, ainda que intenso, de rejeição a tudo, é possível que o eleitor permaneça apegado àquele cuja falta de propostas razoáveis expressa a hostilidade para com o conjunto do que se organizou no país desde a Constituição de 1988.   

Observado de outro ângulo, do ponto de vista do PT, poderia parecer preferível apostar na irracionalidade da direita e ter um extremista como adversário. Tratar-se-ia de uma visão curta. 

Se Bolsonaro chegar a 28 de outubro, mesmo que depois perca, a onda autoritária sairia fortalecida, dificultando a vida de um governo de reconstrução nacional.

Além do mais, derrotar o PSDB obrigará o campo popular a se unir, o que abriria a chance de construir um programa comum e uma frente ampla institucionalizada, até agora inexistentes. Seria, aliás, outra prova de racionalidade, que a esquerda ainda está devendo ao país. 

No fim, o irracionalismo pode vencer. Porém, a onda do momento abriu uma janela para a razão.
 

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