Angela Alonso

Professora de sociologia da USP e pesquisadora do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento

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Angela Alonso

Ataque comparativo

Jogo de equivalência entre Lula e Bolsonaro encobre diferenças que todos conhecem

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Nem bem o lavajatista Fachin pronunciou seu voto, os impassíveis ante um governo que trabalha mais pelo vírus que pelos cidadãos desencadearam o ataque comparativo Lula/Bolsonaro. Passada uma hora, a CNN mandou contar, foram 450 mil postagens, a maioria celebrando o “Lula Livre”. Na leva pró, quase dobrada na hora seguinte, muito confete. Nos memes, um Lula sarado, sorridente, lacrador.

Aturdidos na hora, os contra reagiram com meros 8% das publicações. Mas logo ativaram o método no qual são doutores, o zap-zap. No ambiente intragrupo em que a franqueza é segura, muito centrista abriu o peito, para soltar o rame-rame do tudo farinha do mesmo saco.

Uma dessas mensagem reencaminhada N vezes ladeia presidentes risonhos. “Prós: não é o Lula. Contras: é o Bolsonaro” vem sob o nome do atual. Já para o ex, a legenda se inverte, “Prós: não é o Bolsonaro. Contras: é o Lula”.

Este jogo de equivalência encobre diferenças que todos conhecem ou deveriam conhecer. Os governos de um e outro não podiam ser mais díspares em composição, estilo e políticas, como tantos tantas vezes apontaram.

As urnas aí estão para isso, para que os cidadãos escolham entre possibilidades distintas dentro das regras democráticas. Não é o governo dos melhores, é de quem
logra convencer a maioria.

Por isso a conversa é de dois níveis. No debate entre alternativas, é legítimo que partidários de um e de outro —e dos demais competidores que se espera cresçam e apareçam— defendam seus programas e líderes como os mais aptos ao governo e desconstruam argumentos dos adversários.

Mas quando se trata dos fundamentos do jogo não se pode, nem na brincadeira, igualar os dois presidentes. Os memes bolsonaristas, assim como a derrubada da Bolsa e a inflada do dólar, empanam a diferença essencial de valores e método.

Enquanto um compôs o movimento pela redemocratização do país e defendeu o Estado de Direito, o outro cogitou explodir quartel e se gaba de herdeiro da ditadura. Um investiu em partido, coalizões, compromissos com adversários, de que a Carta aos Brasileiros é emblema. O outro montou o exército internáutico que o catapultou do fundão do plenário ao Alvorada, sem partidos ou programa, no moto contínuo de troçar, desprezar, destruir tudo o que não é espelho.

Lula foi preso e tanto ele quanto seus seguidores contestaram, mas acataram, o veredicto da Justiça. Nenhum soldado com seu cabo invadiu a prisão de Curitiba, nenhum movimento social assaltou o Congresso. Já Bolsonaro jamais aceitou a lisura da própria eleição —a obsessão saudosista pela cédula impressa. O modelo de seus apoiadores, como não se cansam de esclarecer, é o da turba de Trump, a que se insurgiu contra o resultado eleitoral e tomou o Parlamento, deixando rastro patético, sanguinolento e indelével na história norte-americana.

Criar a ilusão da semelhança é eludir o fosso entre os dois no básico dos básicos: um é democrata, o outro, aspirante a déspota nada esclarecido. Se isso não era óbvio, o discurso desta quarta no ABC o escancarou. Como resumiu Rodrigo Maia: “Você não precisa gostar do Lula para entender a diferença
dele para o Bolsonaro”.

Interessa apenas a competidores com menos apelo popular —não há dorismo, nem huckismo— a equivalência de “ismos”, como se houvesse dois movimentos de sectários de igual quilate. Não há. Muitos democratas usaram esta equivalência forçada para justificar o voto nulo em 2018. E assim
ajudaram a eleger o antidemocrata que nos governa.

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