Antonia Pellegrino e Manoela Miklos

Antonia é escritora e roteirista. Manoela é assistente especial do Programa para a América Latina da Open Society Foundations. Feministas, editam o blog #AgoraÉQueSãoElas.

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Antonia Pellegrino e Manoela Miklos

A contracultura política é feminina

A formação de mulheres vai promover uma insurgência

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Balbúrdia é mais perfeita expressão do “governo” Bolsonaro, cujo método político é o conflito entre os poderes. Diante do caos, impressiona o fato da Lei nº 13.831, que anistia partidos políticos, já em vigor, ter feito Executivo, Legislativo e Judiciário darem as mãos. 

A história da construção deste milagre é a seguinte: a Lei dos Partidos Políticos, de 1995, prevê que as legendas devem investir pelo menos 5% de recursos do dinheiro público do Fundo Partidário na promoção da participação feminina na política, que incluem gastos com eventos e propagandas que estimulem e igualdade de gênero. O partido que não cumprir a regra está sujeito a multa. E quem fiscaliza e aplica a multa? A justiça eleitoral.

Deputadas em ato na Câmara por maior participação de mulheres no legislativo
Deputadas em ato na Câmara por maior participação de mulheres no legislativo - Pedro Ladeira 16.jun.2015/Folhapress

Mas entre 2013 e 2018, o TSE fez vista grossa e se tornou cúmplice dos partidos na prática da violência política de gênero. O papel deste tipo de violência é impedir as mulheres de se candidatarem, interferir no exercício de seus mandatos e, por fim, desestimular, desanimar, encurtar, abreviar a carreira política feminina. Ou seja, é uma violência exercida antes, no início, durante e no fim de um mandato, para que o poder se conserve como sempre foi: masculino, branco, de meia idade —ou da idade média. 

Tudo seguia na mais perfeita desordem, até que, em 2018, a professora Lígia Fabris, da FGV, através de uma provocação ao TSE e ao STF, conseguiu 30% dos recursos do fundo de campanha, então recém-criado, para candidaturas de mulheres. O resultado? Um crescimento de 50% na bancada feminina —e a explosão do escândalo do laranjal do PSL, como revelado por esta Folha.  

Na esteira destes acontecimentos, 2019 começa com o TSE disposto a prestar contas com o passado. E em fevereiro, o PSD foi obrigado a destinar R$ 1 milhão em 2020 à atuação feminina, mais 2,5% do fundo partidário com a mesma finalidade. Em março, pelo mesmo motivo, o PDT foi obrigado a devolver R$ 2 milhões ao erário. Em ambos os partidos, houve também suspensão a parcial de recebimento do fundo partidário. O pânico estava instalado.

A resposta veio através do projeto apresentado pelo líder do DEM, dep. Elmar Nascimento, caracterizado como “uma tentativa de conter a ingerência do TSE sobre os partidos”, segundo o deputado Paulinho da Força (Solidariedade). Àquela altura, já eram 70 milhões em multas a partidos de todos os espectros políticos.

Pela pesquisa do Instituto Patrícia Galvão e Ibope, 74% dos brasileiros acredita que só há democracia de fato com a presença de mais mulheres nos espaços de poder e tomada de decisão. Oito em cada dez brasileiras creem que metade das cadeiras legislativas deveria ser destinada às mulheres. E ainda, segundo o DataSenado, 79% dos brasileiros já votaram em mulher. Então, como explicar a baixa representatividade feminina? A falta de apoio dos partidos é o principal motivo, segundo a percepção popular captada no DataSenado. E a história da lei de anistia aos partidos confirma que o povo está certo. 

Com a lei sancionada por Bolsonaro, os partidos ficam livres dessa multa caso tenham financiado candidaturas femininas nas eleições de 2018. Cabe às mulheres fazer uma limonada destes limões. 
A sinalização do TSE é clara: acabou a vista grossa, chegou a hora dos partidos cumprirem a lei e gastarem dinheiro na formação de quadros femininos. Os anos de 2019 e 2020 são estratégicos para o surgimento de novas lideranças, capazes de promover a insurgência de uma contracultura política. O que se espera dos dirigentes partidários é que cumpram a lei e parem de perpetrar violência política de gênero.

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