Atila Iamarino

Doutor em ciências pela USP, fez pesquisa na Universidade de Yale. É divulgador científico no YouTube em seu canal pessoal e no Nerdologia

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Atila Iamarino

O que esperar das vacinas da Covid

Mesmo com 9 candidatas avançadas, seria bom já calibrar nossa expectativa

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Nesta pandemia temos um avanço científico inédito. Passos de criação de vacinas que levavam anos foram dados em meses. Seria legal já calibrar nossa expectativa.

As nove vacinas candidatas que passaram da fase 2 de testes clínicos no mundo se mostraram seguras e despertaram a produção de anticorpos e de células imunes para o combate corpo a corpo com o vírus.

Se isso de fato protege as pessoas é o que descobriremos com testes de fase 3, de eficácia, em que estão agora. Nessa etapa, milhares de pessoas são vacinadas e se compara quantos contraíram a Covid-19 entre os vacinados com os não vacinados (ou quem recebeu uma vacina falsa, o placebo).

O tempo entre vacinação e imunização é de ao menos um a dois meses. Pode demorar mais dependendo das chances de as pessoas entrarem em contato com o vírus e do número de doses. Por isso o Brasil é destino quente para vacinas candidatas, não nos falta gente contraindo coronavírus.

O número de doses atrasa testes pois precisamos dar uma dose, esperar um mês, dar outra dose e esperar mais um ou dois meses para ver se funciona, pelo menos. E 8 das 9 candidatas em fase 3 usam mais de uma dose. Para os testes que começaram em julho, até outubro devemos ver resultados.

Sabemos que a proteção total é improvável. A vacina do sarampo, uma das mais eficazes, protege mais de 90% dos vacinados e os impede de transmitir o vírus —não esqueça de tomar a sua. Já a da gripe protege 60%, em anos que funciona muito bem. E alguns vacinados ainda podem contrair e transmitir o vírus, embora não desenvolvam pneumonia.

Ver uma proteção contra a Covid-19 em algum ponto dessa escala já seria um cenário ótimo. Mesmo se funcionasse como a vacina da gripe, o que ainda exigiria máscaras e algum distanciamento.

Cenários não tão animadores, mas prováveis, são de algumas das candidatas não despertarem uma resposta imune que proteja as pessoas. Algumas podem despertar uma resposta fraca demais para impedir o vírus de causar doença. Casos de reinfecção que começamos a confirmar nos mostram que mesmo a infecção natural pelo coronavírus pode não despertar a imunidade protetora. Por isso precisamos de tantos testes em paralelo.

Outras vacinas podem despertar uma resposta alérgica ou inflamatória que não compensa a proteção. Como a síndrome de Guillain-Barré, na qual a resposta imune contra um vírus ou uma vacina afeta os nervos e pode causar uma paralisia e fraqueza muscular. Como aconteceu com a vacina contra a gripe de 1976, que afetava 1 pessoa a cada 100 mil vacinadas, um problema pequeno pode ficar bem numeroso com bilhões de vacinados.

No pior cenário, a resposta imune não só não funciona como ainda aumenta as chances da doença ser grave. Não temos evidência de que isso vai acontecer com a Covid-19, mas foi esse tipo de reação que nos fez descartar uma vacina contra um vírus causador de resfriado, o RSV, depois de dois bebês vacinados morrerem em 1966.

Cenários graves assim são raros, e justamente por isso podem depender de dezenas ou centenas de vacinados para serem descobertos. Por isso, quando alguma vacina candidata der muito certo, ainda veremos um grupo crescente de pessoas prioritárias sendo vacinadas, como profissionais de saúde, para ver sua segurança em larga escala antes de doses estarem disponíveis para nós.

Até lá, nosso trabalho é convencer negadores da ciência a se vacinar, pois, se a proteção da vacina for parcial, precisaremos de quase todo mundo vacinado ou curado antes de andar em paz na rua.​

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