Atila Iamarino

Doutor em ciências pela USP, fez pesquisa na Universidade de Yale. É divulgador científico no YouTube em seu canal pessoal e no Nerdologia

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Atila Iamarino
Descrição de chapéu Coronavírus

A lua de mel da Covid

O termo foi introduzido em 1988 para representar o período de calmaria que sucede grandes campanhas de imunização

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Ao final de fevereiro, nosso número de casos de Covid-19 continua caindo depois do pico da ômicron. O número de óbitos está estável, acima de 800 por dia, em média, com a possibilidade de seguir a queda dos casos, como se vê nos países europeus com mais vacinação. É um sinal de que podemos estar entrando na lua de mel da Covid.

O termo foi introduzido em 1988 para representar o período de calmaria que sucede grandes campanhas de imunização, induzida por vacinas ou pela doença, onde a incidência de uma doença cai por um período até voltar de novo.

Quando a vacina contra o sarampo começou a ser distribuída, muitos países como Egito, Israel e Filipinas passaram por alguns anos sem novos casos, até passarem por um surto novamente quando a lua de mel acaba.

UTI de atendimento exclusivo a crianças com Covid
UTI de atendimento exclusivo a crianças com Covid do Hospital Cândido Fontoura, o maior do estado de São Paulo - Adriano Vizoni - 4.fev.2022/Folhapress

Essa lua de mel acontece quando a imunização não é suficiente para eliminar o vírus, mas é suficiente para reduzir sua transmissão. Sem tantos vulneráveis, a incidência da doença cai ou mesmo acaba em um primeiro momento. Mas conforme novos vulneráveis surgem e se acumulam, basta um novo caso para a doença circular de novo. No caso do sarampo, os vulneráveis são os recém-nascidos.

A vacinação infantil serve justamente para não deixar vulneráveis. Por isso, o período de lua de mel pode durar anos ou até mais de uma década, a depender de quantas crianças não são vacinadas em uma região.

Já no caso da Covid, a lua de mel pode ser bem mais curta. De um lado, a imunidade natural ou vacinal parece decair em alguns meses. Daí a necessidade da dose de reforço, principalmente entre idosos, que têm a queda de imunidade mais acentuada.

Essa queda de imunidade também acontece com o vírus influenza da gripe. A proteção da vacina contra a gripe costuma durar alguns meses, o suficiente para atravessarmos a temporada de inverno protegidos. No caso da Covid, ao contrário da gripe, o coronavírus continua gerando variantes e circulando mesmo fora do inverno. Então conforme a imunidade contra a Covid cai, ainda encontramos o coronavírus.

Nós já tivemos uma lua de mel da Covid no Brasil. A explosão de casos e a vacinação ao longo de 2021 geraram tantos imunizados que não tivemos a onda da variante delta que se abateu sobre a Europa. Mas a ômicron acabou com essa lua de mel.

Agora, com a passagem dessa onda, podemos entrar em outro período de queda de casos em que parece que tudo se resolveu. Outra lua de mel. Mas em um bom cenário, ainda teremos outras ondas em períodos como o inverno, pelo menos.

O Reino Unido já decretou que a doença passou. Alguns ensaiam fazer o mesmo aqui. Falta combinar com o vírus. Enquanto não tivermos a absoluta maioria vacinada e tratamentos que funcionam como antivirais para quem fica doente, veremos números terríveis.

Pode parecer simples varrer o problema da Covid para baixo do tapete, já que naturalizamos arboviroses como zika, dengue e chikungunya. Mas o tapete precisaria ser bem mais alto para cobrir a Covid. Entre 2008 e 2019, registramos por volta de 11,6 milhões de casos de dengue, chikungunya e zika, que resultaram em 6.429 óbitos —mais de 90% dos casos mortes foram causados pela dengue. Esse período inclui 2015 e 2019, os piores anos já registrados.

Registramos um número comparável de óbitos pela Covid, 6.246, em uma semana de fevereiro. A gripe sazonal —uma endemia que pode não ser tão temida quanto a dengue, mas leva muito mais vidas— mata menos de 25 mil brasileiros por ano. A Covid já ultrapassou esse número em 2022, antes do fim de fevereiro. Antes da nossa lua de mel.

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