Cecilia Machado

Economista-chefe do Banco BoCom BBM, é doutora em economia pela Universidade Columbia

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O Brasil pode pausar

Sacrifício econômico será tanto menor quanto mais rápido houver distanciamento social eficaz

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O estudo do Imperial College divulgado na semana passada colocou de forma bastante clara que as estratégias de mitigação (com distanciamento social) e isolamento total implicam menor número de mortes decorrente da Covid-19 no Brasil: entre 40 mil e 500 mil, comparado a 1 milhão se nada for feito.

Do ponto de vista epidemiológico, as estratégias de mitigação e isolamento horizontal são importantes não só para evitar mortes como também para comprar tempo. Tempo para controlar a propagação do vírus enquanto o sistema de saúde se fortalece. Tempo para que os cientistas entendam melhor as mutações do vírus, sua dinâmica de propagação e sequelas que somente agora começam a aparecer.

Do ponto de vista econômico, o sacrifício em termos de emprego e renda é enorme. Não se pode negar que o distanciamento social e o isolamento horizontal impõe custos à população pobre, aos trabalhadores informais e às firmas atuando nos setores de serviço, com efeitos de transbordamento que são ultimamente compartilhados por todos os setores da economia, em maior ou menor grau, incluindo o governo, através de menor base para a arrecadação de impostos e do aumento de gastos e transferências.

Um trade-off que se coloca, de forma simples e imediata, confronta as mortes decorrentes da Covid-19 e mortes ocasionadas pela crise econômica nas diferentes estratégias. Entretanto, a ausência de ações de mitigação no início da epidemia levará a custos na renda e no emprego ainda maiores em poucos meses. As consequências adversas da doença são reais e inevitáveis, mas é possível minimizá-las escolhendo quando e como agir.

O sacrifício econômico será tanto menor quanto mais rápido implementarmos um distanciamento social eficaz. A China e a Coreia do Sul mostraram que ações rápidas e energéticas permitem a retomada das atividades econômicas em pouco tempo, viabilizando a transição para estratégias de mitigação menos restritivas. Já o adiamento das estratégias de mitigação nos EUA e na Itália implicou parada ainda mais drástica e longa nas suas economias.

É certo que a crise econômica também transborda para o governo, já que ele, assim como as pessoas, depende da economia para sustentar seus gastos.

Os pacotes e as medidas econômicas anunciados pelo governo serão, por questões fiscais evidentes, limitados e temporários. O extenso arsenal apresentado pelo governo —renda mínima para os informais, ampliação do programa Bolsa Família, reforço ao orçamento da saúde, empréstimos e adiamento de impostos para micro e pequenas empresas, entre outros— não será suficiente se o distanciamento social não for eficaz.

A transição para o chamado isolamento vertical agora em consideração —que prioriza circulação de pessoas em setores estratégicos— é evidentemente necessária e desejável. Mas depende de dois outros importantes componentes: testagem e planejamento. A testagem é importante para o controle epidemiológico das transmissões e o isolamento direcionado dos infectados. O foco deve ser a disponibilidade frequente e em larga escala da testagem no Brasil.

Já o planejamento acerca de quais setores devem ser priorizados precisa levar em conta aspectos específicos do país. Por exemplo, o distanciamento social nas favelas não é implementável por muito tempo, e alternativas precisam ser pensadas nessa direção.

O tempo pode ser usado a nosso favor, tanto para salvar vidas quanto para minimizar o dano econômico. Tão importante quanto o distanciamento social efetivo que agora praticamos é o conjunto de ações estratégicas que possibilitarão a transição para um cenário mais permissivo de iterações sociais.

O Brasil pode pausar e usar este tão valioso tempo para se preparar para o dia depois de amanhã.

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