Celso Rocha de Barros

Servidor federal, é doutor em sociologia pela Universidade de Oxford (Inglaterra) e autor de "PT, uma História".

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Bolsonaro, o STF e a Hungria

Presidente se inspira nos 'novos autoritários' como Orbán para neutralizar a corte

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A censura imposta pelo ministro Alexandre de Moraes foi errada porque, bom, é errado censurar a imprensa.

Mas a decisão, felizmente revertida, também foi errada por outro motivo, igualmente grave: enfraqueceu o Supremo Tribunal Federal diante da opinião pública em um momento em que Bolsonaro busca extinguir a capacidade de a corte atuar como garantidora da democracia.

A decisão de Moraes deu, inclusive, a oportunidade de Bolsonaro dizer que defende a liberdade de imprensa. Na verdade, o presidente da República só se opôs à censura nesse caso porque o enfraquecimento do STF lhe interessa.

Se você quer saber qual a verdadeira opinião dos Bolsonaros sobre liberdade de imprensa, ignore a live presidencial e preste atenção na viagem que Eduardo Bolsonaro fez à Hungria de Viktor Orbán na semana passada. Orbán está destruindo a democracia húngara.

O presidente Jair Bolsonaro - Evaristo Sá-8.abr.19/ AFP

Uma matéria do New York Times de 1º de novembro de 2018, baseada em investigações do site investigativo húngaro Atlatszo, mostrou que Orbán vem promovendo a compra dos meios de comunicação húngaros por seus puxa-sacos.

Segundo a reportagem, a mídia húngara era especialmente vulnerável à pressão estatal porque dependia muito de propaganda do governo. Pois é.

Pois bem: Eduardo Bolsonaro escreveu em sua página no Facebook que uma das coisas que aprendeu com Orbán foi justamente "o trato com a imprensa".

Quando você entende o quanto Bolsonaro se inspira nos "novos autoritários" como Orbán, não é difícil perceber por que o STF teme que o presidente da República utilize as investigações da Lava Jato para enfraquecer a Suprema Corte.

Em dezembro último, Orbán reformou o sistema judiciário húngaro, criando uma corte paralela sob o controle de seu ministro da Justiça (isto é, dele mesmo). Essa nova corte cuidará de praticamente todos os assuntos de interesse do governo, como corrupção e, vejam só, eleições. A esta altura do parágrafo, você já deve ter entendido que ela será enchida de puxa-sacos que carimbarão tudo o que Orbán fizer como "de acordo com a Constituição".

Em outros termos, a Hungria não tem mais Constituição. Não importa que a Constituição diga que o poder de presidente tem limites. Quem vai decidir, em cada caso, se esses limites foram violados é o próprio presidente. Assim, até eu.

Bolsonaro também quer neutralizar o Supremo. No começo da campanha, anunciou que empacotaria o STF com dez novos ministros, e você já deve imaginar o quanto essa turma levaria a sério a tarefa de limitar o poder de Bolsonaro.

Voltou atrás, mas a deputada Bia Kicis agora defende a revogação da "PEC da Bengala" que garantiria a Bolsonaro a chance de indicar mais ministros "húngaros".

Da mesma forma, os bolsonaristas fazem campanha para promover o impeachment de ministros do STF. Não é porque sejam contra a corrupção —vejam quanta gente suspeita (ou condenada) compõe o ministério—, mas porque seria uma chance de indicar ministros dóceis.

É justamente por estar sob ataque do autoritarismo bolsonarista que o STF não pode se desviar de sua função de guardião da democracia. No mínimo, não pode dar aos inimigos da democracia a desculpa de que a estão extinguindo para salvá-la.

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