Celso Rocha de Barros

Servidor federal, é doutor em sociologia pela Universidade de Oxford (Inglaterra) e autor de "PT, uma História".

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Celso Rocha de Barros

O Pós-PSDB

O divórcio entre o PSDB e suas origens na esquerda foi assinado

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A convenção nacional do PSDB na última sexta-feira (31) consolidou a candidatura de João Doria à Presidência da República e o definitivo reposicionamento do PSDB no campo da direita. Nada de errado nisso, boa sorte para os caras.

A história dos tucanos é um caso interessantíssimo para a ciência política: foi um caso claro em que a posição do partido dentro da disputa nacional determinou mais seu desenvolvimento do que a ideologia inicial de seus fundadores.

 

O "social democracia" no nome do partido era de verdade. A maior parte dos fundadores do PSDB vinha da centro esquerda, da melhor centro esquerda: FHC, Covas, Serra, Bresser, Montoro. 

Gente fundamental na briga por introduzir a pauta dos direitos sociais na Constituição de 1988. Na verdade, a atuação incontestavelmente de esquerda do PSDB aconteceu aí, antes de sua fundação.

Mas PSDB nunca foi um nome que nomeasse muito bem a coisa. Os partidos sociais-democratas europeus sempre foram estruturados em torno dos sindicatos. Quando o PSDB escolheu seu nome, Franco Montoro advertiu: se o PT moderar o discurso, os sociais-democratas serão eles.

Talvez por essa inconsistência o PSDB tenha sido o único grande partido conhecido mais por sua mascote (o tucano) do que por sua sigla.

Mas a tensão ideológica dentro do partido não se deve apenas à origem de seus fundadores na oposição à ditadura militar.

O PSDB só virou protagonista nacional quando FHC lançou o Plano Real (não, não foi o Itamar, parem com isso). E o Plano Real foi um negócio politicamente muito singular.

No começo dos anos 1990, excepcionalmente, o que era prioritário para a administração macroeconômica também era prioritário para o combate às desigualdades: derrotar a hiperinflação.

Foi nessa confluência que a singular coalizão de políticos sociais-democratas e economistas ortodoxos gerou o PSDB moderno.

Não há a menor garantia de que essa circunstância vá se repetir sempre. É muito comum, e talvez seja a regra, que medidas necessárias à estabilidade econômica gerem mais desigualdade. Por isso, aliás, políticas redistributivas são necessárias.

Eventualmente, a disputa com o PT fez do PSDB o ponto de convergência da direita brasileira. Quem entrou no PSDB a partir do meio dos anos 90 já entrou querendo brigar com a esquerda. As pautas levantadas pelos tucanos, a maneira como votaram no Congresso a partir daí, refletiram essa virada.

Foi um longo processo, mas o divórcio entre o PSDB e suas origens na esquerda foi assinado na última sexta-feira. O PSDB de Doria é um partido claramente de direita, que está, sim, como Gengis Khan, mais ao centro do que Bolsonaro.

Não sei se vai dar certo. Se Bolsonaro for um sucesso, por que alguém votaria em Doria? E se não for, o discurso de direita ainda vai soar tão atraente? Na centro direita, Doria enfrentará a concorrência do DEM e do partido que deve se formar em torno da candidatura de Luciano Huck.

Agora a bandeira social-democrata está esperando que alguém no Brasil a pegue do chão. Se ao menos houvesse no Brasil um partido com base sindical sólida, experiência com políticas de redistribuição de renda e que estivesse precisando reciclar seu discurso, talvez fosse possível fazer alguma coisa a esse respeito.

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