Celso Rocha de Barros

Servidor federal, é doutor em sociologia pela Universidade de Oxford (Inglaterra) e autor de "PT, uma História".

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Celso Rocha de Barros

Os golpistas de 2019

Não há mais como discordar que a democracia brasileira está em crise há vários anos

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A revista Veja desta semana publicou uma entrevista com o presidente do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli. Na introdução à entrevista, Veja fez uma série de revelações importantes: entre abril e maio deste ano, tivemos militares e civis falando em impeachment, empresários tentando achar uma brecha para convocar novas eleições e, o que é incomparavelmente mais grave, “oficiais de baixa patente” falando em uma “sublevação contra as instituições corruptas”.

Enfim, o risco de golpe militar voltou a existir no Brasil, ao menos por alguns meses. É possível que já tenha passado, é provável que o golpe em questão fracassasse. Mas golpes fracassados também são perigosos. Talvez os oficiais de baixa patente tenham planejado um negócio sem chance de dar certo por serem idiotas. Mas também é possível que o tenham feito por terem percebido que, na atual administração, sinalizar golpismo pode ajudar nas promoções futuras. 

O presidente do STF, Dias Tóffoli, ao centro, em evento com os ministros Sergio Moro, da Justiça, e Damares Alves, da Mulher, da Família e Direitos Humanos
O presidente do STF, Dias Tóffoli, ao centro, em evento com os ministros Sergio Moro, da Justiça, e Damares Alves, da Mulher, da Família e Direitos Humanos - Marcelo Camargo/Agência Brasil

Por outro lado, já deve estar claro para os oficiais de alta patente que esse golpe seria contra eles. Não é a única iniciativa nesse sentido. Quem paga o curso de doutrinação que Olavo de Carvalho está oferecendo gratuitamente a policiais militares? Tem gente no bolsonarismo procurando uma turma armada para fazer bagunça. O medo de golpe militar já vem do ano passado e atravessou toda a campanha eleitoral.

No recém-lançado livraço “Os Onze – o STF, seus bastidores e suas crises”, os jornalistas Felipe Recondo e Luiz Weber contam uma história aterradora: quando a Folha revelou a fraude bolsonarista do WhatsApp, um general da reserva publicou ofensas à ministra Rosa Weber, porque ela recebeu parlamentares de esquerda que pediam investigação do esquema.

Em uma reunião em 23 de outubro de 2018, militares e ministros do STF se reuniram para discutir o assunto. Ao fim do encontro, Dias Toffoli dirigiu-se a seus colegas de corte e lembrou que Villas-Bôas tinha à sua disposição 300 mil homens armados que, em sua grande maioria, votariam em Bolsonaro. Tem prova maior da saúde institucional de uma democracia do que o presidente da suprema corte dizendo a seus colegas o equivalente a “rapaziada, ó só, os militares tão com raiva, é melhor fazer o que eles mandam”? 

Tudo isso, repito, aconteceu e talvez continue acontecendo nas sombras, longe do olhar do público. É até difícil julgar os compromissos assumidos por Toffoli nesses meses todos. Se a correlação de forças era tal que era isso ou golpe, Toffoli acertou, e o Brasil deu uma imensa sorte de não ter um sujeito inflexível na presidência do STF nesse período.

Se era possível preservar a normalidade institucional sem isso tudo, Toffoli errou horrendamente. É provável que ninguém nunca descubra qual das duas avaliações é justa. Não há mais como discordar que a democracia brasileira está em crise há vários anos, e que a deterioração se acelerou muito com a eleição de Jair Bolsonaro para a Presidência da República.

O golpe de Estado voltou a fazer parte do repertório de gente que quer subir na vida. Quando Bolsonaro homenageia Ustra, que mensagem está passando para os jovens oficiais? Não tem como saber se a turbulência de abril passou. O que está claro é que Bolsonaro quer que ela volte.

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