Celso Rocha de Barros

Servidor federal, é doutor em sociologia pela Universidade de Oxford (Inglaterra) e autor de "PT, uma História".

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Celso Rocha de Barros

O melhor de Bolsonaro na pandemia é sua ausência na gestão da crise

Parece ter havido esforço coordenado entre os brasileiros de bom senso para mantê-lo isolado até o fim da epidemia

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​A reversão da demissão do ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, na semana passada deu a impressão de que Jair Bolsonaro havia se tornado uma espécie de rainha da Inglaterra com menos experiência militar relevante. A jovem Elizabeth de Windsor, como se sabe, foi mecânica de caminhões durante a Segunda Guerra Mundial.

Parece ter havido um esforço coordenado entre os brasileiros de bom senso para manter Bolsonaro isolado até o fim da pandemia. Congressistas, militares, ministros do STF e mesmo alguns ministros do próprio governo parecem ter atuado para impedir que o presidente da República sabotasse o esforço dos governadores para achatar a curva de contágio.

Se o Brasil sobreviver à epidemia, vai ser graças aos esforços dessa turma.

O presidente da República, Jair Bolsonaro, durante visita ao hospital de campanha de Águas Lindas de Goiás
O presidente da República, Jair Bolsonaro, durante visita ao hospital de campanha de Águas Lindas de Goiás - Marcos Corrêa - 11.abril.2020 /Presidência da República

Mas ainda há um risco grande de tudo dar errado. Porque não basta que o presidente da República não atrapalhe. No sistema brasileiro, é preciso que ele trabalhe, pois há coisas que só ele pode fazer.

Bolsonaro, que fique claro, continua atrapalhando o máximo que consegue. Vai às ruas para sinalizar que o isolamento é desnecessário, conspira abertamente contra o próprio ministro da Saúde, vende para seu público as mentiras vagabundas de Osmar Terra. Fala em “isolamento vertical”, mas, na hora de dizer como os velhos seriam isolados, diz que é problema das famílias. Compra briga com os chineses, grandes produtores de material médico de que precisamos desesperadamente.

No fundo, a mensagem de Bolsonaro para os doentes e parentes das vítimas é a mesma de Augusto Heleno para os congressistas um mês atrás. Bolsonaro não trabalha 15 minutos por dia para combater a epidemia. A revista britânica The Economist citou Bolsonaro como um dos quatro líderes mundiais que menosprezam a ameaça da Covid-19 (os outros são os ditadores de Nicarágua, Belarus e Turcomenistão).
Tão trágica quanto o discurso e o exemplo do presidente da República é sua omissão nas áreas em que só o Poder Executivo pode agir. É o caso da economia.

Bolsonaro gasta seu tempo brigando com os governadores enquanto deveria estar liderando a conversão da indústria nacional em produtora de máscaras, remédios, respiradores. Ao invés de fazer lives com propaganda de remédio, deveria ter pressionado pela liberação mais rápida da renda básica emergencial.

Estudo do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre), da Fundação Getulio Vargas, mostra que as medidas tomadas até agora, por mais importantes que tenham sido, não são suficientes para preservar a renda dos brasileiros. O Brasil ainda não conseguiu garantir aos trabalhadores brasileiros a capacidade econômica de ficar em casa durante o isolamento, e isso é tarefa para a Presidência.

A iniciativa, a ousadia, a visão de longo prazo e a cobrança de eficiência que estão faltando à equipe econômica deveriam estar vindo do Planalto. Mas o Planalto não tem outro plano senão a volta ao trabalho e a aceitação da mortandade em massa. Resta torcer para que Guedes ou alguma coalizão de ministros assuma as rédeas do processo e escape da sabotagem presidencial.

De Jair Bolsonaro, o melhor que se pode esperar continua sendo a ausência. Ele é isso aí, o exato oposto do líder de que o Brasil precisa agora.

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