Charles M. Blow

Colunista do New York Times desde 2008 e comentarista da rede MSNBC, é autor de “Fire Shut Up in My Bones"

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Charles M. Blow

Por que homens do campo da tecnologia são problemáticos em questões de diversidade?

Queridinhos da direita nos Estados Unidos promovem ideias anti-históricas que não passam de bobagens

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The New York Times

Há uma pergunta que me incomoda: por que parece que tantos homens que fizeram sucesso no campo da tecnologia e depois mergulharam na política são tão problemáticos em questões de diversidade e igualdade?

Vivek Ramaswamy, analista de hedge funds que virou executivo de biotecnologia, é o quinto colocado entre os pré-candidatos presidenciais republicanos para 2024, a julgar pela média das sondagens apresentada pela Real Clear Politics.

O republicano Vivek Ramaswamy discursa em Iowa, nos EUA
O republicano Vivek Ramaswamy discursa em Iowa, nos EUA - Eduardo Munoz - 22.abr.23/Reuters

Mas ele compensa seus números modestos com um alto grau de exposição –anunciando sua candidatura num texto de opinião no Wall Street Journal, bajulando a Associação Nacional de Rifles na convenção da organização e fazendo as rondas dos programas de jornalismo das TVs a cabo.

Ele é autor de alguns livros, que incluem "Woke, Inc.: Inside Corporate America’s Social Justice Scam" (Woke, Inc.: Por dentro da fraude da justiça social da América corporativa) e "Nation of Victims: Identity Politics, the Death of Merit and the Path Back to Excellence" (Nação de vítimas: Política identitária, o fim do mérito e o caminho de volta à excelência), e baseia sua campanha principalmente no anti-"wokeness".

Ramaswamy tem tentado bajular Donald Trump —que lidera por margem ampla as pesquisas para as primárias republicanas— , tendo inclusive dito em fevereiro que duvidava que pudesse tornar-se um dos alvos da tão conhecida língua ferina do ex-presidente porque são amigos.

"Acho que temos um profundo respeito mútuo um pelo outro. Nós dois somos pessoas dinâmicas", disse. E muitos de seus pontos de vista não diferem muito dos do governador da Flórida, Ron DeSantis –que está em um distante segundo lugar nas pesquisas, atrás de Trump, e é outro cruzado anti-woke.

Quando Ramaswamy iniciou sua campanha, ele postou no Twitter: "Estamos no meio de uma crise de identidade nacional. Fé, patriotismo e trabalho duro desapareceram. ‘Wokeismo’, ‘climatismo’ e ideologia de gênero os substituíram." Seu tuíte veio acompanhado de um vídeo que cita o discurso "Eu tenho um sonho", de Martin Luther King Jr. –o único discurso de King que os republicanos citam, ao que parece.

Rawasmamy satisfaz muitos dos requisitos ideológicos atuais dos republicanos, dizendo que quer "fechar" o FBI, declarando que acabará com a "ação afirmativa nos EUA" e pedindo que a idade mínima para votar seja elevada para 25 anos, exceto pelos eleitores mais jovens que se alistam nas Forças Armadas, trabalham como socorristas ou passam por exames de cidadania.

Assim, não chega a surpreender que ele esteja rapidamente virando um queridinho da direita. Mas o que me surpreendeu inicialmente, sim, foi um ensaio publicado esta semana pela revista Politico do ex-candidato presidencial democrata Andrew Young –advogado que virou empreendedor tech e depois virou político—, dando conselhos a Rawasmamy sobre como conquistar a indicação presidencial republicana.

Depois de refletir sobre o assunto por um instante, porém, percebi que não é tão surpreendente assim, afinal. Inicialmente, eu admirava Yang. Em 2019, quando nos conhecemos no set do programa "Real Time with Bill Maher", fiquei impressionado. Ele tinha uma maneira nova e instigante de explicar suas propostas políticas, especialmente as econômicas, em termos claros e com simpatia. Eu o descrevi como "um futurista no meio de convencionalistas e bolcheviques".

Alguns meses antes de se retirar da disputa, ele manifestou seu apoio condicional ao pagamento de reparações, dizendo à revista Time: "Este país foi construído sobre as costas de negros, e temos uma dívida maciça com eles. Sou a favor do HR-40, o projeto de lei que explora como seriam as reparações". Essa declaração deu a entender que ele compreendia o caráter fundamental da raça e do racismo na história americana, independentemente da posição de qualquer um sobre a questão de reparações.

Mas quanto mais Yang se revelava, especialmente em torno de questões raciais, mais ele passou a me desagradar. As piadas que ele contava durante a campanha tendiam a ser do tipo que envolve o estereótipo dos asiático-americanos como minoria exemplar –"o oposto de Donald Trump é um asiático que curte matemática", "eu sou asiático, por isso conheço muitos médicos"— e eram repudiadas por muitos asiático-americanos, e por mim.

No ano passado Yang defendeu o podcaster Joe Rogan por ter usado um termo pejorativo racista, tuitando: "Não creio que Joe Rogan seja racista –o cara interage com pessoas negras e trabalha com elas literalmente o tempo todo", antes de deletar o tuíte e pedir desculpas.

Em março, em seu próprio podcast, ele questionou a decisão do Partido Democrata de fazer da Carolina do Sul –estado onde a maioria dos eleitores democratas são negros— a primeira primária em seu calendário eleitoral, sugerindo que a iniciativa transmite esta mensagem: "Sinto muito, brancos da zona rural do meio-oeste, vocês não são mais uma prioridade do Partido Democrata".

Quando se soma isso tudo, a impressão é que o que Yang está oferecendo agora é uma plataforma de anti-wokeness, menos ferina mas mesmo assim insincera –que agora uma parte grande de sua mensagem envolve minimizar a importância da questão racial.

Por que? Será que ele sempre pensou assim, mas conseguiu ocultar o fato quando precisou dos votos de um eleitorado democrata racialmente diverso?

Ou será que isso ilustra o modo em que certo tipo de político –no caso aqui, os "bros" tech, que muitas vezes se posicionam como sendo diferentes dos políticos de carreira e gostam de enxergar-se como pensadores de olho no futuro— pode perpetuar posições sobre questões raciais que são minimizadoras, corrosivas e retrógradas?

No momento é possível que o "bro" tech político de mais alto perfil seja Elon Musk, que se caracterizou como defensor da liberdade de expressão quando comprou o Twitter, mas parece utilizar o site como pódio para explicitar suas posições. Ele já tuitou sobre "derrotar os liberais", incentivou o voto em republicanos nas midterms do ano passado e zombou de camisetas impressas com o slogan "#StayWoke" (continue woke).

O sucesso no setor tech conferiu a esses caras uma imagem não merecida de seriedade e de serem empresários não convencionais (vale recordar que foi em parte assim que acabamos com Trump como presidente).

Na realidade, porém, eles não estão fazendo mais do que tentar agradar a eleitores que gostariam de eliminar as complexidades da história de nosso país –os eleitores que parecem acreditar que tornar os EUA grande outra vez significa minimizar o valor de tantos que lutaram e lutam pela igualdade, há gerações. Como figuras políticas, eles não são inovadores. Estão promovendo ideias anti-históricas que não passam de bobagem.

Tradução de Clara Allain

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