Neste março de 2021, mês em que a pandemia se revela mais letal no Brasil, poderes constituídos vivem grandes convulsões.
Não como parte de um esforço coletivo das instituições para tirar o país do triste lugar de campeão mundial de mortes por Covid.
Os poderes institucionais vivem um tensionamento diante da escalada de autoritarismo que é uma reação desesperada da alta gestão pública que vem fracassando seguidamente na redução da tragédia da pandemia.
Em meio a esse tensionamento, um ministro e três lideranças das Forças Armadas brasileiras foram demitidos e, ato contínuo, reafirmaram posicionamento de respeito à Constituição Cidadã como princípio de sua missão institucional.
A posição atual do Brasil é extremamente fragilizada para enfrentar os desafios de uma pandemia, considerando que o Estado de bem-estar social, as políticas públicas, os direitos e as redes de proteção social foram duramente atacados nos últimos cinco anos, por alguns setores econômicos, políticos e midiáticos.
Abriram mão da ética e moral, manipularam informações, negociaram com perversos, na esperança de que isso os ajudaria a derrubar o Estado de bem-estar social e a impor uma agenda focada em satisfazer a ganância por lucros e concentração de rendas.
Mas não se atentaram para o fato de que sistemas perversos permitem que aflorem mais e mais perversos que ficam totalmente fora de controle. E deu no que deu!
No atual momento, diferentes lideranças institucionais —empresários, parlamentares, agentes financeiros— se articulam para buscar vacina. Será que estão reconhecendo que a economia não será retomada se não for controlada a pandemia via aceleração da vacinação contra a Covid?
Será que conseguem incidir sobre uma mortandade que vem afetando os segmentos mais vulnerabilizados, os pobres, periféricos, negros e negras, indígenas, quilombolas, que dependem quase que exclusivamente do SUS, sistema que vem socorrendo o país e impedindo que a crise sanitária seja ainda mais pesada?
Em nota técnica, a Congregação da Faculdade de Saúde Pública da USP chama a atenção para o perigo da estratégia de imunidade coletiva por contágio, que gera centenas de milhares de mortes e ameaça o SUS, ampliando os gastos com insumos, fragilizando o seu equilíbrio federativo, sobrecarregando seus profissionais e serviços.
Segundo Boletim da Fiocruz, pesquisa com 4.384 profissionais de saúde de todas as regiões do país revelou que 41% estão com insônia, 44%, em crise de ansiedade, e 21%, com sintomas de “burnout”.
A luta desses profissionais e de todos nós é permanecer saudáveis num contexto que gera medo, ansiedade, ataques de pânico, insônia, desânimo, requerendo processos solitários e dolorosos de luto.
A epidemia mexe com nosso dia a dia, com as maneiras como estamos nos relacionando conosco e com os outros, com nossa vida afetiva, sexual, e agrava problemas como abandono, solidão, violência, com impactos que se tornam mais intensos considerando gênero, raça, idade e orientação sexual.
Precisamos de tempo emocional para “digerir” e lidar com a situação extrema que estamos vivenciando. E encontrar formas de compartilhar cuidados e localizar ajuda mais direcionada quando necessário.
Contribui muito nos insurgirmos contra a forma como está sendo conduzido o enfrentamento da pandemia, questionando o que está definido no país, quanto à gestão pública.
Precisamos pressionar as instituições para uma coordenação efetivamente nacional da pandemia, como orientam especialistas das mais importantes instituições no campo da saúde. É fundamental que possamos assegurar o distanciamento social e, ao mesmo tempo, garantir a todas as pessoas proteção e auxílio emergencial digno que permita que as populações mais fragilizadas não sejam atingidas por mortes evitáveis.
Um país rico como o Brasil em recursos materiais e imateriais pode, coletivamente, reencontrar um caminho mais humanizado.
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