Cida Bento

Conselheira do CEERT (Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades), é doutora em psicologia pela USP

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A Casa do Povo

Reforma eleitoral expõe os perigos de um Parlamento com pouca diversidade

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O Congresso Nacional é conhecido como “a Casa do Povo”. Quando olhamos o perfil de quem “habita” essa Casa do Povo, vemos que é majoritariamente constituído de homens brancos, empresários, de classe alta, com ensino superior completo, de meia-idade e a maioria deles reeleita; ou seja, “políticos de carreira”.

Já o povo brasileiro é majoritariamente negro (54%), feminino (51%), 42,4% têm menos de 30 anos, e apenas 48,8% de pessoas com 25 anos ou mais finalizaram a educação básica obrigatória (IBGE). E a classe baixa subiu de 38%, em 2010, para os atuais 47% (Instituto Locomotiva).

Dessa forma, parece que o Congresso Nacional não é mesmo a Casa do Povo. Pois é, esse Congresso está propondo uma reforma eleitoral perigosa para a democracia, que caminha rapidamente sem transparência e sem debate social.

Funcionários retocam a pintura da cúpula do Senado, no Congresso Nacional. Com ajuda de escadas e cordas, os responsáveis pela manutenção do órgão renovam a pintura que esteva já desgastada - Pedro Ladeira - 2.ago.2016/Folhapress

Dentre tantas reações da sociedade civil diante dessa violência, um “Manifesto Contra a Reforma Eleitoral em Curso” foi lançado pela Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político.

O manifesto denuncia que a reforma modifica o sistema eleitoral para o modelo mais caro e individualista do mundo: o distritão, sistema considerado por cientistas políticos como antidemocrático e ineficiente.

A reforma desconsidera a desigualdade étnico-racial na disputa eleitoral e desmantela estruturas de ação afirmativa para fortalecimento político e econômico de mulheres candidatas, como a obrigação de preencher o mínimo 30% de candidaturas femininas, com igual percentual de tempo de rádio e TV e de financiamento público.

“No caso de mulheres negras, que são mais subfinanciadas e sub-representadas na política, os impactos serão extremamente nocivos. Teremos ainda menos mulheres negras nos espaços de decisão política do país”, diz a historiadora Giselle dos Anjos, integrante da Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político.

A reforma altera ainda o sistema de eleição, estabelecendo o voto impresso. Diminui punições pelo mau uso de verbas públicas no período eleitoral e anistia os partidos políticos que não cumpriram a distribuição financeira com equidade de raça e as cotas de financiamento de gênero.

Está sendo necessária uma grande luta para impedir os retrocessos e a destruição do que já foi conquistado no sentido de trazer mais diversidade para o Parlamento.

A Coalizão Negra Por Direitos, que congrega mais de 200 organizações, está à frente de um amplo movimento para ocupar o Twiter usando a hashtag #ReformaRacistaNão.

Diversos coletivos de organizações da sociedade civil estão se mobilizando contra o absurdo que caracteriza essa reforma ou golpe eleitoral. A articulação apressada é para que as novas regras tenham validade já nas eleições de 2022.

Sem dúvida é mais um passo na escalada antidemocrática que o Brasil vem vivendo e expõe os perigos de um Parlamento com pouca diversidade como o brasileiro e que quer se manter no poder a qualquer custo. E com muito dinheiro, que, aliás, é dinheiro do povo brasileiro, pois propuseram que seja triplicado o valor do fundo eleitoral.

Eles fizeram um radical pacto narcísico de permanecer no poder ou de só deixar que outros venham, se tiverem o mesmo perfil. E a sociedade civil há muito se movimenta para que o Congresso Nacional se
constitua verdadeiramente na Casa do Povo, ou seja, que focalize o combate às desigualdades e assegure que os perfis dos parlamentares sejam tão diversos quanto é diversa a sociedade brasileira.

Por isso é urgente provocar a sociedade a participar das discussões e interditar a aprovação desse projeto, pressionando o Congresso e enviando mensagens aos parlamentares envolvidos na votação. Sigamos, pois, lutando por um parlamento menos monolítico que colabore na construção de um Brasil mais justo e igualitário

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