Claudia Costin

Diretora do Centro de Políticas Educacionais, da FGV, e ex-diretora de educação do Banco Mundial.

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A história e os riscos civilizatórios

O estudo cuidadoso da história pode nos ajudar a evitar a repetição de erros

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Uma das questões do primeiro dia de prova do Enem se referia a Hannah Arendt, pensadora alemã que se debruçou sobre os desafios de seu tempo e tentou entender como pessoas com acesso a uma educação de qualidade puderam perpetrar terríveis atrocidades contra grupos humanos inteiros e fundar propostas de poder em que o ódio organizado ao outro fosse o elemento que desse unidade a uma nação.

O totalitarismo, descrevia ela, tanto na vertente nazista quanto na do stalinismo instalado na União Soviética, tirava parte de sua força de um sistema de propaganda baseado em notícias falsas e na criação de um movimento de suporte ao regime, numa visão semirreligiosa, em que as aspirações dos indivíduos que o integravam eram esmagadas e substituídas por uma lealdade acrítica não só ao líder, mas à causa que ele personificava. No mesmo sentido, os membros do núcleo central do movimento, embora soubessem da não veracidade de pretensões vocalizadas pelo líder, julgavam importante confirmá-las para o avanço de ideias reservadas aos "iniciados".

Nas duas vertentes, um ponto em comum: o indivíduo, que havia emergido com o Iluminismo, é sacrificado a projetos de poder que se nutrem de ressentimentos da população para dar-lhe um sentido coletivo e de pertencimento, centrado no combate a inimigos ficcionais. Assim, puderam os alemães reduzidos à pobreza e à perda do orgulho nacional, adquirido havia menos de um século, pensar que o futuro a eles pertencia, que os culpados de sua miséria, a "conspiração judaico-marxista", deveriam ser eliminados e que a grandeza da raça, expurgada de não arianos, resgataria o prestígio de uma nação que deveria se colocar acima das outras.

Da mesma maneira, Stalin, embora adversário do líder nazista, para consolidar seu poder, centrava sua retórica contra inimigos reais ou fictícios, inclusive um pretenso complô judaico, e na necessidade de controlar pensamentos e desejos. Ter ideias próprias e espontaneidade individual, nos dois casos, aparecia como um perigo a ser evitado, de preferência por autocensura.

Não vivemos hoje mais em regimes totalitários, mas o estudo cuidadoso da história pode nos ajudar a evitar a repetição de erros passados. Afinal, o ressentimento e a perda de sentido de pertencimento vigentes podem ser mobilizados por políticos irresponsáveis e levar-nos a tragédias civilizatórias.

A base da civilização que construímos ao longo dos anos, com todas as dificuldades da democracia, repousa no respeito a cada indivíduo e a um projeto coletivo que estimula a preservação da diversidade. E isso precisa ser ensinado às novas gerações. 

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