Claudia Costin

Diretora do Centro de Políticas Educacionais, da FGV, e ex-diretora de educação do Banco Mundial.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Claudia Costin

Perdas civilizatórias

Conquistas para sociedade mais inclusiva podem se perder pelo desejo de voltar a ser politicamente incorreto, racista e ofensivo

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

As redes sociais parecem ter liberado vozes que não encontravam canal de expressão em outras circunstâncias. Clamores contra limitações impostas por avanços civilizatórios aparecem em diferentes formatos, denunciando o quanto seria desagradável seguir um roteiro politicamente correto, não poder ofender minorias ou fazer chacota com os “menos iguais”.

Foi difícil, ao longo da nossa história, construir visões menos excludentes e fazê-las avançar na sociedade. Apesar de ainda existir uma discriminação velada —e, em alguns países, um pouco ostensiva— dificilmente um governo se gabava, a partir do final do século 20, de ser abertamente racista, negar fatos históricos registrados e adotar um discurso de supremacia do seu povo ou grupo étnico.

Mas o advento de um processo acelerado de automação, que inclui a inteligência artificial, passou a destruir postos de trabalho, até alguns que demandam competências intelectuais. Com isso, a desigualdade social passou a crescer e, com ela, o descontentamento com uma ordem mundial que, ao conectar países, quebrou elos de pertencimento dos que se sentiam antes incluídos, levando-os a uma frenética busca de bodes expiatórios.

Paradoxalmente, a entrada, há poucos anos, de novos atores, numa sociedade que já foi mais restrita, também contribuiu para certo mal-estar. Quando o clube dos que detêm privilégios admite desiguais, há os que se sintam invadidos no seu direito de exclusividade. Na verdade, trata-se de sociedades que começam a se estreitar, penalizando a classe média e minorias que haviam chegado, dependendo do país, há pouco tempo.

A pandemia não contribuiu para melhorar a cena pública. Ao contrário, iluminou ódios e ressentimentos ao mesmo tempo em que culpabilizou inimigos imaginários, numa situação em que a população de outros países —embora não de todos— conseguiu se unir contra a ameaça real: o vírus.

Na verdade, de uma maneira ou de outra, alguns avanços civilizatórios correm mesmo o risco de se perderem. Aparentemente, queremos ter a liberdade de ofender minorias, de agregar-lhes sofrimento e proibir-lhes o acesso a espaços que acreditamos reservados apenas a quem, por algum critério, é igual a nós. Afinal seriam eles os culpados pelo mal-estar que experimentamos.

E neste contexto, perdemos todos. As conquistas resultantes de lutas travadas por várias gerações para constituir uma sociedade mais inclusiva podem se perder pelo ressentido desejo de poder voltar a ser politicamente incorreto, racista e ofensivo com tudo o que, de forma incorreta, pode ser usado como bode expiatório para a crise que vivemos.

LINK PRESENTE: Gostou desta coluna? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.