Há muito se fala da importância da leitura literária para a formação cultural nas escolas. Ler livros, de fato, amplia o repertório dos alunos, colocando-os em contato com outras comunidades, com sua história, costumes, geografia. Ajuda também, como sugere a neurocientista Maryanne Wolf, a desenvolver empatia.
Para que isso funcione bem, as salas de leitura ou bibliotecas escolares precisam contar com um bom acervo de livros, adaptados para cada faixa etária, e reservar um tempo na jornada escolar para frequência a esse espaço, tanto para atividades coletivas quanto para leitura individual por prazer. Além disso, é importante que se construa, a partir da educação infantil, um roteiro literário voltado a desafiar os alunos a leituras cada vez mais complexas. Em escolas europeias, por exemplo, livros em capítulos são apresentados aos alunos a partir do 3º ano e há produção textual, além de discussões em aula, associados ao que foi lido.
Mas a literatura não faz sentido apenas nas escolas. Ler deveria ser um hábito a ser mantido ao longo da vida, tanto para continuar a jornada de aprendizagem como para termos acesso ao que de mais belo e instigante a humanidade produziu.
José Mindlin, o maior bibliófilo brasileiro, lembrava que, num país de não leitores, adquiriu o hábito da leitura ao ver sua família lendo à noite, cada um com seu livro. Ou seja, essa importante atividade de lazer e informação pode ser adquirida tanto na escola como em casa, com pais leitores.
Mas há algo que me intriga na escolha de obras a serem lidas: buscamos, como adultos, literatura que dialogue com o que nos dá identidade. Assim, o que lemos pode acabar reforçando a fragmentação e o tribalismo que vêm definindo nossa cena política e cultural. Se somos brancos ocidentais, os livros são de um cânone referenciado por Harold Bloom, mas se asiáticos ou africanos, preferimos obras de autores que vivem naquelas partes do mundo.
É compreensível que assim seja, mas temos uma humanidade compartilhada e muito o que aprender uns com os outros. Até porque o Ocidente não é só branco, e, dentro dele, o Brasil menos ainda, como bem ilustra Laurentino Gomes em seu segundo volume da série "Escravidão", e as questões que afetam países da Ásia ou da África nem sempre são puramente locais.
Lendo recentemente e na sequência dois livros extraordinários --o "Pavilhão Dourado" do polêmico escritor japonês Yukio Mishima, e o romance "Se o Passado não Tivesse Asas" do angolano Pepetela--, pensei em como vale a pena sair da bolha e olhar para o outro, tão humano como nós, em suas fragilidades e realizações.
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.