Cláudia Collucci

Jornalista especializada em saúde, autora de “Quero ser mãe” e “Por que a gravidez não vem?”.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Cláudia Collucci

Após 3 anos da tragédia de Mariana, 39% dos jovens têm sinais de depressão

Pesquisa da UFMG detectou alta taxa de sofrimento social entre as vítimas

Quem ainda se importa com as vítimas da tragédia de Mariana (MG) que nesta segunda (5) completa três anos? 

No maior desastre ambiental do Brasil causado pela ruptura da barragem do Fundão, 19 pessoas morreram e 670 km de ecossistemas foram destruídos com o vazamento de rejeitos de minério que contaminou e exterminou a vida no Rio Doce.

 

Há, porém, uma outra tragédia em curso: 82,9% das crianças, adolescentes e jovens que presenciaram o desastre estão com sinais de transtorno de estresse pós-traumático. Nos adultos, 12% dos atingidos tiveram esse diagnóstico.

Pesadelos recorrentes relacionados ao desastre são relatados por 19,5% dos entrevistados. Um quarto (24,4%) apresenta insônia, 46,3% manifestaram irritabilidade ou crises de raiva.

Os resultados são de um estudo da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), que pesquisou sobre a saúde mental das famílias atingidas pelo rompimento da barragem e que foi divulgado em abril deste ano.

Foram ouvidas 276 vítimas individualmente, 42% são crianças e adolescentes, entre 10 e 17 anos. Nesse grupo, 91,7% testemunharam o desastre e 8,7% receberam notícias sobre ele.

O estudo tentou mensurar qual será o impacto desses distúrbios na vida dos jovens daqui para frente, já que, do ponto de vista cerebral, algumas partes só vão atingir maturação completa aos 21 anos.

Entre os jovens, 39,1% possuem sinais de depressão e 26,1% apresentam ou já apresentaram comportamento suicida. Entre os adultos, o risco de suicídio foi identificado em 16,4% dos entrevistados.

Em relação à depressão, a taxa de prevalência é dez vezes superior à observada na população geral desse público (3,5%). O risco de tirar a própria vida também está acima da média nacional, estimada em 7,1%.

Na população pesquisada, 18,2% tomam ansiolíticos para dormir e 16,9% utiliza antidepressivos. É o caso do lavrador Marino D´Angelo Junior, morador no subdistrito de Paracatu de Cima, que desde então sofre de transtorno de ansiedade e de depressão.

Há um claro sofrimento social como pano de fundo disso tudo. Os moradores perderam parentes e amigos, foram obrigados a deixar casas, objetos pessoais de forma abrupta. O pouco que sobrou foi saqueado por ladrões.

Eles perderam a sensação de pertencimento. São pessoas que nasceram na zona rural e foram realocadas desde então para a cidade. Perderam horta, cachoeira e toda uma tradição secular de vida, relatam os pesquisadores.

Mais do que isso. Cerca de 60% dos atingidos dizem sofrer preconceito de outros moradores, já que muitos perderam o emprego por causa da paralisação das atividades da mineradora Samarco desde a tragédia. Ficam revoltados ao verem as vítimas recebendo um valor mensal como forma de ressarcimento.

Nem as crianças estão sendo poupadas. Muitas delas sofrem bullying nas escolas, sendo chamadas, por exemplo, de pés-de-lama.

Segundo a Secretaria Municipal da Saúde de Mariana, os atendimentos à saúde mental não cessaram desde o rompimento da barragem e são feitos em dois Caps (Centro de Atenção Psicossocial). Nas escolas atingidas pela tragédia, há dois profissionais referência, que atendem exclusivamente crianças e adolescentes.

A Fundação Renova, criada para gerir as ações de reparação da tragédia, também desenvolve um estudo sobre a saúde mental dos atingidos, em parceria com o Instituto Saúde e Sustentabilidade. A conclusão dos trabalhos está prevista para fevereiro de 2019.

"Essa lama não matou apenas 19 pessoas, ela continua nos matando até hoje", disse o morador  D´Angelo Junior em depoimento à National Geographic. Que o país não feche os olhos para isso. 

Saio de férias a partir de hoje. Até a volta!

Tópicos relacionados

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.