Cláudia Collucci

Jornalista especializada em saúde, autora de “Quero ser mãe” e “Por que a gravidez não vem?”.

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Cláudia Collucci

EUA apuram se lesão pulmonar em jovens está ligada a cigarro eletrônico

No Brasil, Anvisa inicia processo para possível regulamentação de dispositivos

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No momento em que a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância em Saúde) inicia processo para possível regulamentação de cigarros eletrônicos no Brasil, casos de doenças pulmonares ligados ao uso desses dispositivos nos Estados Unidos acendem o alerta de que eles podem não ser tão inofensivos quanto o marketing da indústria faz parecer ser.

O assunto permeia a agenda da Anvisa há dez anos, quando foi proibida a comercialização, a importação e a propaganda de cigarros eletrônicos. Desde 2016, no entanto, a agência vem levantando novas informações sobre o tema e, no último dia 8, aconteceu a primeira audiência pública, que será complementada por uma outra no próximo dia 27.

Algumas questões cruciais permanecem sem respostas conclusivas, como quais os reais impactos do uso desses dispositivos e quais os efeitos a longo prazo na saúde.

Segundo reportagem publicada pelo Washington Post na última sexta (16), autoridades de saúde estaduais e federais dos EUA estão investigando pelo menos 94 casos de doenças pulmonares misteriosas ligadas ao uso de cigarros eletrônicos em 14 estados, a maioria envolvendo adolescentes e jovens adultos. Alguns deles precisaram ficar em UTIs, com ventilação artificial.

As autoridades estão alertando os médicos e o público a ficarem atentos ao que descrevem como uma lesão pulmonar grave e potencialmente perigosa. Os sintomas incluem dificuldade para respirar, falta de ar ou dor no peito antes da hospitalização. Os pacientes também relataram febre, tosse, vômito e diarreia.

Segundo os Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA (CDC), embora todos os pacientes relatem ser usuários de cigarros eletrônicos, ainda não se sabe com certeza se as doenças estão associadas aos dispositivos ou aos ingredientes inalados por meio deles.

Os pacientes descreveram que inalaram uma variedade de substâncias, incluindo nicotina, produtos à base de maconha e "home-brews" (do tipo "faça você mesmo").

Os cigarros eletrônicos viraram uma febre entre jovens americanos, apesar da pouca pesquisa sobre os seus efeitos a longo prazo. E já chegaram ao Brasil, mesmo proibidos. Existem sites de comércio exclusivos de cigarros eletrônicos e seus acessórios e muitos vendedores usam a plataforma do Mercado Livre para comercializá-lo. Os preços variam entre R$ 200 e R$ 1.400.

Conforme a Folha mostrou em junho último, as estratégias usadas por aqui são bem semelhantes as que fazem sucesso lá fora: publicações em redes sociais, divulgação por meio de influenciadores digitais e estandes em festivais e baladas.

Diante do alerta das autoridades de saúde americanas, a marca líder de cigarros eletrônicos, a Juul, disse que está acompanhando os relatórios sobre as doenças pulmonares associadas ao produto e afirma que tem “sistemas robustos de monitoramento de segurança”.

Uma associação que defende o uso dos dispositivos disse que a cada mês, cerca de 10 milhões de adultos estão aderindo aos cigarros eletrônicos sem grandes problemas e que é provável que os produtos que estão causando as lesões pulmonares sejam aqueles vendidos nas ruas contendo drogas ilegais, e não nicotina.

Mas, por enquanto, não há certeza de nada, muito menos da segurança do uso por jovens. Em janeiro de 2018, um relatório das Academias Nacionais de Ciências, Engenharia e Medicina concluiu que, embora os cigarros eletrônicos sejam menos prejudiciais do que os convencionais (que produzem uma série de substâncias tóxicas quando queimados), eles representam riscos para a saúde de adolescentes e adultos jovens que não fumam. Entre os efeitos estão o aumento da tosse, sibilância (assobio agudo durante respiração) e ataques de asma.

Por isso, é benéfica a cautela com que a Anvisa vem tratando o tema. Foi árdua a luta para que o Brasil reduzisse em 40% o percentual de fumantes, de 15,6% em 2006, para 9,3% em 2018, segundo dados do Ministério da Saúde. Apesar dos avanços, entre os jovens de 18 a 24 anos nas capitais, a prevalência subiu de 7,4% para 8,5%. É justamente essa população a mais vulnerável ao cigarro eletrônico, com muito marketing voltado para elas.

Mesmo com a redução, o tabagismo ainda é um problemão para a saúde individual e pública:12,6% das mortes no Brasil são atribuíveis ao cigarro. Em números absolutos, são 156.216 óbitos por ano. Os custos anuais do consumo de tabaco para o país, traduzíveis em despesas médicas e perda de produtividade do trabalhador, chegam a R$ 56,9 bilhões, montante muito superior aos R$ 13 bilhões arrecadados pelo Estado na tributação dos produtos derivados do fumo.

Por isso tudo, é preciso que governos e sociedade civil fiquem bem atentos não só para lobbies relacionados à liberação do cigarro eletrônico como também para os que defendem a redução dos impostos sobre o tabaco. Parafraseando o que disse recentemente o diretor do FDA, Scott Gottlieb, "não podemos permitir que uma nova geração seja viciada em nicotina".

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