Cláudia Collucci

Jornalista especializada em saúde, autora de “Quero ser mãe” e “Por que a gravidez não vem?”.

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Cláudia Collucci

Estudo associa crise econômica ao aumento de 31 mil mortes no Brasil

Impacto da recessão foi menor em municípios com maiores gastos no SUS e no Bolsa Família

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A recessão econômica brasileira está associada a um aumento de 4,3% na taxa de mortalidade adulta entre 2012 e 2017. Em números absolutos, isso significaria 31.415 mortes a mais relacionadas à crise, segundo artigo recém-publicado no renomado periódico científico The Lancet Global Health.

Pesquisadores do Brasil e do Reino Unido, autores do estudo, examinaram as taxas de mortalidade em 5.565 municípios brasileiros nesse período e cruzaram com dados do Ministério da Saúde, do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome e do Sistema de Informação Orçamento Público em Saúde.

Um aumento de um ponto percentual na taxa de desemprego foi associado a um crescimento da taxa de mortalidade de 0,5 por 100 mil habitantes por todas as causas, principalmente em razão do câncer e de doenças cardiovasculares. 

O crescimento da mortalidade por todas as causas foi observado mais entre homens, entre os que se autodeclaram negros ou pardos e entre pessoas com idades entre 30 a 59 anos. Não houve associação significativa identificada entre o desemprego e a mortalidade em brasileiros brancos, mulheres, adolescentes, idosos e aposentados.

Nem todos os municípios do Brasil foram afetados negativamente pela recessão. Cidades com maiores gastos no SUS e no Bolsa Família apresentaram nenhum ou aumentos menores na mortalidade, revela o estudo.

Outros trabalhos internacionais já mostraram que as crises econômicas podem piorar a saúde em países de baixa e média renda com mercados de trabalho e sistemas de saúde e proteção social fracos. Na Europa, por exemplo, o impacto da recessão econômica foi menor em países com fortes programas de saúde e proteção social, incluindo acesso a seguro-desemprego e apoio à reciclagem de habilidades para as pessoas que perdem seus postos de trabalho.

Como no Brasil muitos brasileiros estão inseridos informalmente no mercado de trabalho, em empregos mal remunerados e sem acesso a seguro-desemprego ou plano de saúde, os autores afirmam que é crucial que o financiamento do SUS e programas de proteção social como o Bolsa Família sejam protegidos.

“Esses programas são reconhecidos internacionalmente e fornecem proteção vital para a saúde e o bem-estar do país”, disse Thomas Hone, autor principal do estudo, do Imperial College London.

Para o médico Luis Correa, especialista em medicina baseada em evidências, as análises adicionais do trabalho (como o perfil de pessoas e de municípios mais afetados pela recessão) reforçam a causalidade entre a crise e o aumento de mortes. "Se fosse apenas a demonstração de que houve aumento de mortalidade na crise econômica, ficaria muito fraco." 

O estudo, realizado como parte de um programa conjunto Brasil-Reino Unido de pesquisa sobre o sistema de saúde brasileiro, joga luz em um velho debate entre os analistas econômicos. Parte deles defende que, numa recessão econômica, é preciso cortar tudo.

O ajuste fiscal foi o amargo remédio adotado pela então presidente Dilma Roussef (PT) na crise de 2014. Em 2016, Michel Temer aprovou a emenda constitucional 95, que congelou os gastos públicos federais por 20 anos, ou seja, só devem crescer apenas de acordo com a inflação do período.

Outros economistas defendem que, quando há alta do desemprego, é preciso manter os gastos sociais para proteger as populações mais vulneráveis.

Hoje resta pouca dúvida de que a EC 95 representa uma grave ameaça ao SUS, sistema cronicamente subfinanciado e que tem visto seus recursos minguarem cada vez mais. Quando a emenda foi aprovada, a equipe econômica da época garantiu que não haveria perdas para a saúde, mas basta comparar as previsões orçamentárias que o engodo fica claro.

Pela regra anterior à EC 95, o orçamento da saúde para 2020 deveria ser de 132,3 bilhões, mas segundo projeto enviado para o Congresso pelo governo de Jair Bolsonaro (PSL), o montante deverá ser de 122,9 bilhões, ou seja, nove bilhões a menos.

Ainda assim, R$ 8,1 bilhões desse montante são recursos provenientes de emendas parlamentares, dinheiro que deputados e senadores destinam a suas bases eleitorais. Sem eles, o Orçamento do próximo ano não alcançará o mínimo constitucional a ser aplicado na área, estimado em R$ 121,2 bilhões.

Tá ruim? Pode piorar muito mais.

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