Clóvis Rossi

Repórter especial, foi membro do Conselho Editorial da Folha e vencedor do prêmio Maria Moors Cabot.

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Ruído de sabres na Venezuela

Prisão de centauros de Chávez indica rachadura na coesão militar, mas qual a extensão da discórdia?

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Ruído de sabres é uma expressão usual na América Latina para referir-se aos sabres de cerimônia dos militares, quando se mexem para depor governos e tomar o poder.

A expressão caiu de moda, assim como os golpes militares, nos últimos 20 ou 30 anos, mas está ressurgindo agora em um país, a Venezuela, em que há, paradoxalmente, uma ditadura cívico-militar, 
mais militar que civil, aliás.

O episódio mais notório de ruídos na relação do governo de Nicolás Maduro com os militares foi a prisão na semana passada de Miguel Rodríguez Torres, que foi ministro do Interior de Hugo Chávez —e, como tal, responsável pela montagem do aparato repressivo do chavismo.

Em foto de 15 de outubro de 2014, o então ministro da Justiça Miguel Rodríguez Torres, fala com o presidente Nicolás Maduro no palácio presidencial Miraflores, em Caracas, na Venezuela.
Em foto de 15 de outubro de 2014, o então ministro da Justiça Miguel Rodríguez Torres, fala com o presidente Nicolás Maduro no palácio presidencial Miraflores, em Caracas, na Venezuela. - Ariana Cubillos/AP

Rodríguez Torres foi também um dos mais proeminentes membros do chamado 4F, o grupo de militares liderados por Chávez, que, no dia 4 de fevereiro de 1992, tentou derrubar o governo de 
Carlos Andrés Pérez.

Justifica-se, portanto, a designação de “centauro de Chávez”, que lhe foi dada por outro dissidente do chavismo, Rafael Ramírez, ex-presidente da estatal petrolífera PDVSA.

Além dos laços com o inventor do “socialismo do século 21”, Rodríguez Torres é amigo do ministro da Defesa, Vladimir Padrino López, pilar essencial na manutenção do apoio dos militares à ditadura.

A prisão de Rodríguez Torres pode ser a mais significativa, mas não é a única.

A Frente Institucional Militar, grupo de oficiais da reserva críticos da ditadura cada vez mais ativo, denuncia que o governo está fazendo uma ofensiva nos quartéis, prendendo “oficiais de diferentes 
patentes nos últimos 20 dias”.

Acrescenta o presidente da Frente, o vice-almirante da reserva Rafael Huizi Clavier: “A crise na instituição castrense é mais profunda do que se crê e começa a alcançar várias peças importantes do 4 de fevereiro”.
No total, calcula-se que cerca de 60 oficiais tenham sido presos nos últimos quatro anos.

Nessas circunstâncias, cabe prestar atenção à análise que fez para El País desta quarta-feira (21) Joaquín Villalobos, um ex-guerrilheiro salvadorenho que hoje é consultor para solução de conflitos.

Escreveu Villalobos: “As ditaduras não caem porque seu poder de coerção se debilita, mas porque se rompe a coesão em suas fileiras. A caçada a militares não é uma manifestação de força, mas uma evidência de rachaduras no regime”.

Reforça Risa Grais-Targow, responsável pela Venezuela na consultoria Eurasia: para ela, a prisão de Rodríguez Torres “sugere que Maduro está ativamente preocupado com a coesão interna e, particularmente, com a lealdade dos militares, apesar do sucesso na consolidação do 
controle institucional”.

Difícil, ante o secretismo que o sistema mantém, avaliar qual é o grau da rachadura entre os militares, que, sempre é bom repetir, são parte intrínseca do regime. 

De todo modo, é preciso que o ruído de sabres aumente muito para que Maduro fique realmente ameaçado. Até porque os cubanos controlam o serviço de inteligência e a repressão, tarefas em que 
são especialmente competentes.

Seja como for, há fantasmas na paz dos cemitérios imposta em Caracas.

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