Clóvis Rossi

Repórter especial, foi membro do Conselho Editorial da Folha e vencedor do prêmio Maria Moors Cabot.

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Na Itália, a política perde, mas ninguém ganha

Depois de eleições, não há partido ou coligação com maioria suficiente para governar

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Ativista com máscara do político Silvio Berlusconi em Roma, um dia depois das eleições na Itália
Ativista com máscara do político Silvio Berlusconi em Roma, um dia depois das eleições na Itália - Max Rossi/Reuters

A política italiana é tão caótica que o país teve 64 governos nos últimos 70 anos. Por incrível que pareça, na eleição de domingo (4), conseguiu dar um passo adiante e, com ele, tornar-se ainda mais caótica.

Dos resultados, surge o seguinte resumo: o governo perde, a política tradicional perde, mas ninguém ganha, pela simples razão de que não surgiu partido ou coligação com maioria suficiente para governar.

Se a confusão já não fosse grande o suficiente, há dois ganhadores diferentes: como coalizão, ganha a centro-direita, mas, como partido isolado, ganha o indefinível M5S (Movimento 5 Estrelas), que nasceu faz apenas cinco anos e é o campeão da antipolítica.

Ao ser o mais votado, perde, pois, a política.

Mas a política tradicional perde também com a vitória da coligação de centro-direita, porque o que havia de tradicional nela (a Força Itália, do inoxidável Silvio Berlusconi) teve menos votos do que a xenófoba e anti-europeia Liga (antes Liga Norte). É a primeira vez na história das conturbadas relações entre Berlusconi e “leguistas" que o veterano político de 81 anos fica atrás de seus sócios.

A derrota de Berlusconi foi explicitada já na madrugada desta segunda-feira (5), quando Matteo Salvini, líder da Liga, se declarou com “o direito e o dever” de governar. Mata, com essa frase, o candidato de Berlusconi para presidente do Conselho de Ministros, Antonio Tajani, presidente do Parlamento Europeu (o próprio Berlusconi está impedido de governar, condenado por fraude tributária).

Para o imbróglio ser completo, ofereceu-se também Luigi di Maio, o jovem (31 anos) líder do M5S, montado nos seus 32% de votos, pouco menos do que o dobro da Liga (17%).

Caberá ao presidente Sergio Mattarella decidir agora quem chama primeiro para conversar sobre a formação do governo, se o líder do partido mais votado ou o líder do partido mais votado na coligação que teve mais votos.

O governo em funções é produto de um entendimento implícito entre Berlusconi e Matteo Renzi (Partido Democrático, centro-esquerda).

Se Berlusconi perde para a Liga e Renzi perde para o M5S, como perdeu, é uma clara derrota do governo.

Não deixa de ser um resultado estranho quando se sabe que, em 2017, a economia italiana cresceu 1,5% pela primeira vez no século 21, menos que a média europeia, é verdade, mas mais que zero que foi a média entre 2001 e 2015.

O desemprego reduziu-se, pouco, é verdade, mas caiu para 11,5%, o menor nível em cinco anos.

Não bastou para vencer. Dois fatores que levaram votos aos cestos da Liga e do M5S: o fastio dos italianos com os políticos, fenômeno similar ao de outros países (Brasil inclusive), e o susto com a chegada maciça de imigrantes.

É tamanho o medo que, embora os imigrantes sejam 8,8% da população, pesquisa recente mostrou que os italianos acham que são 30%.

A Liga, principal voz contra a imigração, se beneficiou nitidamente dessa sensação de invasão: praticamente quadruplicou os 4% de votos que havia obtido na eleição anterior, em 2013.

Por fim, depois dos sustos superados na Holanda, na França e na Alemanha, a Europa tropeça na Itália: tanto a Liga como o M5S são críticos ou da política desenhada em Bruxelas ou da própria ideia de União Europeia.

O susto só fico um tiquinho menor porque, primeiro, o M5S de agora é, para Massimo Franco, colunista do Corriere della Sera, “uma versão edulcorada, menos antissistema". Se é assim e se for chamado a governar, não se aventurará a questionar a Europa.

Já a Liga, para governar terá que manter a coligação de centro-direita unida, o que implica acalmar Berlusconi, cujo vínculo nem sempre tranquilo com a Europa foi claramente exposto com a indicação para premier de Antonio Tajani, presidente de um instituição europeia.

Enfim, depois da tempestade que foi a eleição, a Itália terá que mergulhar fundo no seu caótico labirinto político.

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