Clóvis Rossi

Repórter especial, foi membro do Conselho Editorial da Folha e vencedor do prêmio Maria Moors Cabot.

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Na Itália, é melhor sem governo

Eleição caminha para dar razão a Mussolini, que dizia que governar o país não é difícil, apenas é inútil

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Cartazes de partidos políticos rasgados ou pichados em Roma
Cartazes de partidos políticos rasgados ou pichados em Roma - Alberto Pizzoli/AFP
 

Uma parcela importante dos italianos parece concordar com uma frase famosa atribuída ao ditador Benito Mussolini, executado em 1945, que dizia não ser difícil governar a Itália. Era simplesmente inútil.

Tanto concorda que, se as pesquisas para a eleição de domingo (4) estiverem certas, haverá tal pulverização de votos que se tornará difícil que alguém consiga maioria suficiente para governar.

Seria o caos, então? Não necessariamente: a política italiana é um caos permanente, a ponto de o país ter conhecido 64 governos nos últimos 70 anos.

Nem por isso naufragou, o que dá mais razão ao execrável ditador Mussolini. Mesmo Luigi Zingales, que emigrou faz 30 anos para os EUA e que, em artigo nesta quarta-feira (28), retratou seu país como um navio prestes a afundar, descreve assim a Itália: "Pessoas nos EUA estão habituadas com a alta qualidade das exportações italianas, não apenas em moda e comida (o sucesso de Eataly é um exemplo) mas também em manufaturas hi-tech, da Ferrari à Technogym. Se você tiver sorte suficiente para viajar à Itália, encontrará um belo país com alto padrão de vida e pessoas adoráveis".

Zingales leciona na badalada Universidade de Chicago, a Eataly está presente também no Brasil, com certo sucesso, e a Technogym é fabricante de equipamentos para ginástica, exportados para vários países.

Convém acrescentar que, nesses 70 anos com 64 governos, a Itália saiu das ruínas deixadas pela guerra de 1939-45 para a posição de quarta maior economia da Europa.

É natural, portanto, que se dissemine a ideia de que ao governo compete apenas não atrapalhar, tese que Gianfranco Carbonato, dono de uma fábrica de máquinas com plantas em quatro países, expôs sem constrangimentos ao "Financial Times":

"A esperança [para a eleição de domingo] é que os os políticos não estraguem muito as coisas. Políticos devem continuar trabalhando para fazer este país ser mais normal, não inventar Deus sabe que tipo de solução. Esse é o perigo".

No caso específico da votação de domingo, o perigo está menos em que não haja uma maioria para formar governo e mais em que a maioria seja alcançada por uma coligação esdrúxula.

Diz, por exemplo, Scott B. MacDonald, economista-chefe da empresa Smith's Research and Gradings: "Se os partidos eurocéticos conseguirem formar uma coalizão, a Itália poderia enfrentar um referendo sobre deixar a zona do euro, hipótese que complicaria gravemente o financiamento da dívida do setor público [€ 2,3 trilhões ou 132% do PIB], o que perturbaria os mercados europeus e também os globais".

Os partidos eurocéticos a que MacDonald se refere são a xenófoba Liga (antes chamada Liga Norte) e o indefinível M5S (Movimento 5 Estrelas).

A Liga na campanha está coligada com Força Itália, do inoxidável Silvio Berlusconi (pouco eurocético), e com os fascitoides do Irmãos da Itália. A coalizão aparece à frente nas pesquisas, mas como partido isolado a liderança é do M5S.

Parece claro, pois, que ninguém conseguir maioria é menos arriscado do que uma maioria que se atire a uma aventura.

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