Clóvis Rossi

Repórter especial, foi membro do Conselho Editorial da Folha e vencedor do prêmio Maria Moors Cabot.

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Clóvis Rossi
Descrição de chapéu Venezuela

De repente, acredita-se na derrota de Nicolás Maduro

Começa a crescer um movimento para desencorajar a abstenção na eleição venezuelana

Cartaz eleitoral em Caracas com imagens de Hugo Chávez e do ditador venezuelano, Nicolás Maduro
Cartaz eleitoral em Caracas com imagens de Hugo Chávez e do ditador venezuelano, Nicolás Maduro - Ariana Cubillos - 16.mai.2018/Associated Press

Imagine um país que vai promover eleições na seguinte situação:

1 - A economia sofreu uma contração de sufocantes 31,9% nos cinco anos de mandato do presidente que agora quer a reeleição, segundo as contas da Comissão Econômica para América Latina e Caribe;

2 - O Fundo Monetário Internacional informa, por sua vez, que a variação de preços neste ano eleitoral será de estratosféricos 12.870%, a mais alta do mundo. Só a cesta básica custou, em abril, 92,5% mais do que em março, segundo a Federação de Professores da Venezuela;

3 - Há uma absurda escassez de quase tudo, de papel higiênico a remédios.

Em um país assim, o governo de turno, seja qual for, pode ganhar uma eleição? Pode se for a Venezuela de Nicolás Maduro, que tenta a reeleição neste domingo (20).

Pode em uma de duas circunstâncias: ou por meio de uma fraude, como a que já foi praticada na votação da Assembleia Constituinte em 2017. Ou se os eleitores acatarem em massa a orientação de abster-se dada pela maioria dos líderes oposicionistas.

Se a abstenção ficar em 50%, Maduro ganha, afirma, por exemplo, Luis Vicente León, presidente do  Datanálisis, o mais respeitado instituto de pesquisas do país (ganha sem precisar de fraude, acrescento eu).

É por isso que começa a crescer um movimento para desencorajar a abstenção. Mesmo analistas que entendem a posição adotada pelos partidos oposicionistas de pregar a ausência estão defendendo agora o comparecimento às urnas.

(A abstenção) “é compreensível, mas inútil. Ao deixar de votar, a oposição desperdiçará a única chance, em anos, de quebrar esta ditadura”, escreve para The New York Times Javier Corrales, professor de ciência política no Amherst College.

Corrales acha que, se a abstenção for baixa, a oposição tem chance de vencer, considerando-se a avassaladora impopularidade de Maduro (taxa de desaprovação em torno de 70%).

Concorda com ele até mesmo um dos líderes da MUD (Mesa de Unidade Democrática, o conglomerado oposicionista que decidiu pela abstenção).

Em programa de televisão, Jesús “Chúo” Torrealba, que foi secretário-geral da MUD, o cargo mais alto da coalizão, disse que o cenário mais provável é o do triunfo de Henri Falcón, o único líder oposicionista que desafiou a MUD e resolveu concorrer.

Não é o único a antever um papel relevante para Falcón, dissidente do chavismo e que agora dissente também da oposição. Em conversa com a Folha, em evento no México, o ex-presidente dominicano Leonel Fernández desenhou um cenário de sonho para o pesadelo venezuelano: Falcón ou ganha ou tem um desempenho excepcional, o que, segundo Fernández, poderia levar Maduro a propor um governo de união nacional para enfrentar a crise.

Fernández não é um completo “outsider”: foi um dos três ex-chefes de governo que mediaram um diálogo (frustrado) entre governo e oposição.

Tenho sérias dúvidas de que tal cenário seja factível, mas a alternativa é horrenda: continuar a ver “uma geração perdida nascer na Venezuela”, como disse o pediatra Franco Sorge à sempre excelente Sylvia Colombo, desta Folha.

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