O texto de hoje é dedicado aos que romperam com parentes e amigos nos meses mais recentes e se sentem incomodados com essa situação.
Pois aviso que você não está sozinho no mundo, como descobri no jornal El País nesta segunda-feira (1º).
O governo de Berlim organiza, a cada dois meses, seminários (grátis) para ensinar como lidar com preconceitos disparados pelos populistas e seus simpatizantes.
Um exemplo: “Outro dia, uma senhora no trem ficava dizendo que os refugiados são uns parasitas. Fiquei bloqueada, sem saber o que dizer", contou uma das frequentadoras do curso a Ana Carbajosa, repórter do jornal espanhol.
Outra relatou algo que, suspeito, muito brasileiro poderia repetir: contou que o natal em família, no ano passado, havia sido difícil, exatamente pelo bloqueio ao diálogo entre pessoas com visões de mundo diferentes.
Ana Carbajosa deixa claro que não é uma situação só alemã: escreveu que o que chama de “fenômeno cunhado” não é exclusivamente espanhol.
Imagino que queira dizer que briguinhas em família estão se dando em toda a parte. Tanto é assim que uma jovem disse ao se apresentar ao curso de Berlim: “Todos temos familiares e amigos que, com o passar dos anos, foram mudando. Eu quero que me ajudem a aprender a relacionar-me com eles".
É por isso que digo que este texto está dedicado aos que têm idêntica intenção. Os que chutaram o pau da barraca da família (ou dos amigos) e não pretendem consertá-la podem passar a outra coluna.
Outro participante do grupo, Elvin Hülser, diz algo que vale também para o Brasil dos tempos recentes: "Que as pessoas pensem certas coisas não é novo. O novo é que, agora, se atrevem a dizê-lo".
No Brasil, que pessoas defendam a ditadura não é propriamente novidade. O novo é que um candidato com essa disposição tenha sido lançado, pela primeira vez na democracia, e, ainda por cima, tenha vencido a eleição.
Alguns dos temas que os participantes expuseram nas dinâmicas de grupo talvez tenham surgido também para você. A saber: “O dinheiro dos meus impostos vai para outros"; “mudança climática sempre houve".
Ou esta que aparece em alemão, em português e em dezenas de outros idiomas: “Na Alemanha já não se pode falar de nada” (alusão ao politicamente correto, que irrita o populismo em qualquer língua).
Tenho sérias dúvidas de que, no Brasil, algo assim poderia ser implementado. Os seminários são organizados pela Central Regional para a Formação Política, um organismo público dependente do governo berlinense.
Essa instituição oferece educação cívica, a partir de uma base pluralista. Um conselho de administração do Parlamento vela pela imparcialidade da instituição.
Pluralismo e imparcialidade são bens em falta no mercado político brasileiro. Logo, aqui vale mais ainda a frase de Albert Einstein que Methuja Thavarasa, a professora do seminário de Berlim, citou: “É mais fácil desintegrar um átomo que um preconceito”.
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