Clóvis Rossi

Repórter especial, foi membro do Conselho Editorial da Folha e vencedor do prêmio Maria Moors Cabot.

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Clóvis Rossi

Espanha vota domingo, com dor

Medo, mais que esperança, condiciona o sufrágio

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Em um mundo ideal, eleição é aquele momento em que o votante deposita esperança na urna. Fica evidente que a Espanha não vive precisamente momentos de idílio com a política e, por extensão, com as urnas, pois esperança é o bem mais escasso a ser depositado no pleito deste domingo (28).

O retrato mais preciso —e melancólico— desse desconforto com o voto aparece na coluna da escritora Lara Moreno para El País desta quarta-feira (24).

Depois de assistir aos dois debates da semana entre os principais candidatos, Lara escreveu algo que muitos brasileiros pensaram em 2018: “Eu queria votar com paixão. Eu queria votar com convencimento. Queria votar com os olhos abertos, não com os olhos fechados. Eu, sobretudo, queria votar sem dor. Espanha, que o domingo lhe seja leve”.

Da esquerda para a direita, os candidatos Pablo Casado (Partido Popular), Pablo Iglesias (Podemos), Pedro Sánchez (PSOE) e Albert Rivera (Cidadãos) participam de debate em Madri - Javier Soriano - 23.abr.19/AFP


É pouco provável que venha mesmo a ser leve. Prevalece o voto com dor ou o voto do 
medo, em vez da esperança.

À esquerda, o medo é do crescimento do Vox, partido de recente formação, saudosista da ditadura franquista, que infelicitou o país durante os quase 40 anos que se seguiram à guerra civil de 1936/39.

É tão reacionário que, para apoiar na Andaluzia os partidos de centro e centro-direita mais votados, exigiu que estes renunciassem a medidas contra a violência machista. Santiago Abascal, seu líder, disse que tais medidas correspondem a “mandamentos da ditadura de gênero”.

Qualquer semelhança com o machismo do bolsonarismo não é mera coincidência: Vox é um dos grupos que tende a se integrar à internacional de extrema direita em formação na Europa, sob o comando de Steve Bannon, ex-conselheiro de Donald Trump, ídolo dos Bolsonaros.

Já a direita teme que o favorito —Pedro Sánchez, do Partido Socialista Operário Espanhol, atual presidente do governo— dê corda para o movimento independentista da Catalunha, que representa outro tipo de radicalismo.

Consequência inexorável dos medos de um lado e de outro: a fragmentação dos votos, mais complicada por ocorrer em um país que viveu sob bipartidarismo a maior parte de seus 42 anos de democracia.

Kiko Llaneras, especialista de El País em pesquisas, fez a média dos levantamentos publicados domingo (21) e segunda (20), os últimos que podem ser divulgados, e concluiu que o partido mais votado nem chegaria a 30% —seria o PSOE de Sánchez, que ficaria com 29,6%.

Seguem-no o conservador PP (Partido Popular), com 20%; o centrista Cs (Ciudadanos), com 14,6%; UP (Unidos Podemos), o grupo esquerdista surgido do movimento dos indignados, com 12,9%; 
e o Vox, com 11%.

Llaneras considera o resultado mais provável que a esquerda forme o governo, com a soma de PSOE e UP (mais eventualmente o apoio de partidos regionais). Dá a essa alternativa 45% de probabilidades.

Resolve o desconforto apontado pela escritora Lola Moreno? Nem remotamente, porque o imbroglio é tal que Llaneras descreve um paradoxo: “O mais provável (55%) é que não se produza o resultado mais provável [o dos 45% de probabilidades]”. 

Alternativas: um governo de direita, uma aliança PSOE/Cs, um acordo do PSOE com os partidos catalães 
pró-independência ou um bloqueio completo.

Dá para perceber, pois, que, qualquer que seja a paixão de cada eleitor, dificilmente ela vai se satisfazer quando as urnas se abrirem.

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