Clóvis Rossi

Repórter especial, foi membro do Conselho Editorial da Folha e vencedor do prêmio Maria Moors Cabot.

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Clóvis Rossi

Quando o papa ajuda uma ditadura

Francisco tira de Manágua bispo que enfrenta Ortega

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O papa Francisco chamou ao Vaticano o bispo auxiliar de Manágua, Silvio José Báez, um movimento mal explicado e que debilita a mobilização contra a ditadura do casal Daniel Ortega e Rosario Murillo.

Debilita em um momento crucial: a revolta popular completa um ano exatamente neste mês de abril (dia 18) e está de novo bloqueado o diálogo entre o governo e a Aliança Cívica, o conglomerado que representa diferentes segmentos da oposição.

Monsenhor Báez, ao lado de outros religiosos, arriscou a vida durante os protestos cívicos de 2018 para evitar a matança de pessoas ameaçadas pelas forças policiais e paramilitares do regime. 

Desde o primeiro momento das manifestações, utilizou o púlpito e o Twitter para exigir a Ortega e Murillo o fim da repressão, que deixou milhares de feridos e mais de 325 assassinados, segundo organismos internacionais de direitos humanos.

 

Com o diálogo, Ortega trata de ganhar tempo, ao passo que a Aliança Cívica exige a libertação dos presos políticos —já foi solta uma pequena parte dos mais de 500 sequestrados pelo regime.

Quer, acima de tudo, a antecipação das eleições para que o ditador deixe o poder antes de 2021, que é a data prevista pelas regras vigentes.

É natural, nesse contexto, que o premiado escritor Sérgio Ramírez tenha tuitado que o que chama de “exílio forçado” de Báez representa “um duro golpe na luta pela democracia na Nicarágua”.

Elabora um pouco mais o ativista Enrique Sáez, em artigo para o diário digital Confidencial: o golpe mexe com “as fibras mais sensíveis da imensa maioria do povo nicaraguense”. A fibra sensível é o sentimento religioso, que a maioria compartilha.

A única informação sobre os motivos do papa para levar o bispo ao Vaticano foi dada diretamente a ele, nos seguintes termos: “Me interessa tê-lo comigo aqui [no Vaticano]. Neste momento, te necessito”.

Báez deixou claro que não foi ele quem pediu para sair. Obedeceu “amorosamente”, como disse, a um pedido do papa, que teria manifestado grande interesse pela atividade do bispo auxiliar, pela vida dele e pela situação da Nicarágua.

Quando Báez diz que o papa se interessa pela vida dele, parece estar dando uma indicação do motivo de fundo de sua convocação: o religioso estaria em uma lista de pessoas a serem assassinadas, segundo denúncia recente da ex-embaixadora americana na Nicarágua, Laura Dogu.

Báez foi atacado publicamente por Ortega, que o chamou de “bravucón” (algo como bravateiro) e golpista.
Tirá-lo do país facilita a vida do ditador, mas não impede o assédio ao regime. Está tão acossado que um tuíte recente mostra uma foto de Ortega debilitado com a legenda “coma andante”, em vez de comandante.

E vale a análise que fez para o jornal digital El Faro e para o El País da Espanha o criador de El Faro, Carlos Dada: “Pouco sobra da revolução [sandinista] que inspirou movimentos revolucionários de 
toda a América Latina”.

“Nada mais longe do homem novo do que este homem velho, aferrado a um poder corrupto e repressivo, a um sistema econômico neoliberal ajudado pela Venezuela e cúmplice de grandes empresários vorazes e corruptos, que, durante a última década, ditaram as políticas econômicas e se tornaram mais ricos em um dos países mais pobres do continente.”

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