Clóvis Rossi

Repórter especial, foi membro do Conselho Editorial da Folha e vencedor do prêmio Maria Moors Cabot.

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Clóvis Rossi

Voto na Europa equivale a novo 'milagre'

Depois de tantos tormentos, vencem os de sempre

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Na véspera do domingo (26) em que terminou a eleição para o Parlamento Europeu, a Lena (sigla em inglês para Aliança de Jornais Europeus Líderes) publicou uma coleção de artigos de seus chefes de Redação que representaram uma ode ao projeto europeu.

Seleciono trecho de um dos textos, de Carlo Verdelli, diretor de La Repubblica (Itália): “Depois de mais de 60 anos de convivência, a unidade europeia parece tão assentada e irreversível que muitos não veem mais que seus defeitos e se esquecem de que é, acima de tudo, um milagre da história".

Milagre assim descrito por Verdelli: “Um continente que estava devastado por ditaduras e guerras se converteu em um modelo de paz, democracia e liberdade". Acrescento eu: converteu-se também no menos desigual modelo de desenvolvimento econômico e social.

Parlamento Europeu em Bruxelas acompanha a eleição do bloco
Parlamento Europeu em Bruxelas acompanha a eleição do bloco - Francois Lenoir/Reuters

Pois bem, a eleição para o Parlamento Europeu acabou sendo de certa forma um novo milagre: os europeus que, de fato, vinham resmungando muito contra a construção que tinham feito em conjunto, acabaram dando a vitória aos partidos que apoiam a construção.

Claro que o jornalismo enfatiza, por definição, o que é anômalo, não o que é rotineiro. Logo, quase todos os jornais puseram o foco no avanço dos populistas da extrema direita, eurocéticos e xenófobos. De fato, cresceram, mas a rotina repetiu-se: os partidos do establishment (conservadores civilizados, a social-democracia e os liberais) triunfaram.

Se a eles se somar o desempenho dos verdes, tem-se que dois terços dos europeus votaram pela Europa, um milagre, se se considerar que a votação se deu depois de uma onda de terrorismo sem precedentes; depois do primeiro pedido de saída do bloco feito por um membro (o Reino Unido); depois de uma formidável crise econômica; e depois da ascensão dos nacional-populistas em vários países.

Nesse cenário realmente tóxico, é extraordinário que o partido do governo de turno tenha sido o mais votado em pelo menos 16 dos 28 países que compõem o bloco.

É claro que seria tolice para as lideranças pró-Europa adotarem uma atitude de complacência só porque não houve a temida onda populista de extrema direita.

Afinal, como diz análise do ECFR (sigla em inglês do Centro Europeu para Relações Internacionais), a votação demonstrou que “os eleitores são voláteis e não mais casados a partidos em particular”. Alusão à significativa queda nos votos para conservadores e sociais-democratas.

A União Europeia terá que encontrar uma saída para a crise da imigração, que é o combustível principal a turbinar a extrema direita. E terá, acima de tudo, de tratar com mais profundidade a questão da mudança climática, cujo apelo está demonstrado pelo crescimento dos verdes.

O ECFR, em recente pesquisa, contabilizou profundo interesse pelo tema da mudança climática mesmo em países em que o populismo nacionalista venceu, casos da Itália (74% de interesse) e da Hungria (73%), para não mencionar porcentagens elevadas na Alemanha, na Espanha e na França.

Para os fanáticos do bolsonarismo, fica a demonstração de que seus ídolos e potenciais sócios europeus são por enquanto bem minoritários no cenário eleitoral. Insistir, como fazem eles e seus ídolos, em que são “o povo” oposto à “elite”, é desconhecer que a “elite” demonstrou ter mais prestígio eleitoral.

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