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clóvis rossi

 

03/05/2010 - 18h20

Olho no olho, mas ouvidos surdos

O presidente iraniano Mahmoud Ahmedinejad complicou um bocado a visita que seu colega brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva fará a Teerã dentro de duas semanas.

Por partes:

1 - O que Lula vai fazer em Teerã, além de negócios, hoje parte indissociável da diplomacia presidencial? Vai, segundo o próprio Lula disse recentemente, olhar nos olhos de Ahmedinejad e perguntar se o programa nuclear iraniano é ou não para fins nucleares.

Se essa pergunta tivesse algum sentido antes, agora não tem mais.

O secretário-geral da ONU, Ban Ki-Moon, fez esta segunda-feira, na conferência sobre o Tratado de Não-Proliferação Nuclear, o que Lula pretendia (ou ainda pretende) fazer em Teerã: disse que "o Irã tem a responsabilidade de esclarecer as dúvidas e as preocupações sobre seu programa nuclear".

Ahmedinejad esclareceu? Nada. Voltou à catilinária contra os Estados Unidos, o cântico favorito dos aiatolás que dirigem o Irã desde a revolução islâmica de 1979.

2 - Além disso, o presidente iraniano desancou tanto as Nações Unidas como a Agência Internacional de Energia Atômica, responsável pela vigilância dos programas nucleares.

Disse que são ambas "exploradas" pelos Estados Unidos, o que deixa mal o Brasil e todos os demais 189 países-membros da ONU que aceitam essa "exploração" (o Brasil ainda se esforça para ser membro permanente do Conselho de Segurança, o coração do sistema "explorado").

3 - Se nem a ONU nem a AIEA servem, quem é capaz de conduzir negociações com o Irã? O governo brasileiro sempre defendeu o multilateralismo, de que a ONU é o principal palco, tanto para negociações como para eventualmente a adoção de sanções. O chanceler Celso Amorim me disse, em janeiro, que o Brasil, embora contrário às sanções, as aplicaria, se aprovadas no âmbito adequado que é o CS da ONU.

Tudo somado, a conversa Lula/Ahmedinejad será, em vez de olho no olho, um diálogo de surdos, em que um diz o que sempre disse, o outro responde com o que também sempre disse, e fica-se exatamente no ponto em que se estava antes de o presidente brasileiro viajar a Teerã.

clóvis rossi

Clóvis Rossi é repórter especial e membro do Conselho Editorial da Folha, ganhador dos prêmios Maria Moors Cabot (EUA) e da Fundación por un Nuevo Periodismo Iberoamericano. É autor de obras como 'Enviado Especial: 25 Anos ao Redor do Mundo' e 'O Que é Jornalismo'. Escreve às terças, quintas, sextas e domingos.

 

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