Colo de Mãe

Cristiane Gercina é mãe de Luiza e Laura. Apaixonada pelas filhas e por literatura, é jornalista de economia na Folha

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Colo de Mãe

A diferença entre ser mãe e ter filhos

Colocar outro ser no mundo exige reflexão e responsabilidade

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São Paulo

Minha mãe repetia exaustivamente algo que ela ouvia de sua madrasta —minha mãe ficou órfã aos quatro anos de idade—, que repetia a frase ouvida de mãe: "qualquer uma pode ter filho, mas nem todo mundo pode ser mãe".

Em geral, a frase vinha acompanhada de uma conversa profunda sobre maternidade quando víamos nascer novos filhotinhos no mundo animal. Mamães dizia: "galinhas têm filhos, vacas têm filhos, cachorras, gatas, éguas e muitos animais têm filhos, mas a capacidade de cuidar com profundidade e criar um outro ser com laços afetivos é de quem realmente é mãe".

Mamãe pontuava essa questão porque, para ela, uma cachorrinha que cuida de seus bebezinhos está exercendo a maternidade enquanto um ser humano que não tem empatia com sua cria não a exerce.

Ser mãe também é sobre ter filhos, mas não é apenas sobre isso. Ser mãe vai além, é sobre ser você em outro ser - Fotolia

Hoje, sabemos que há mais mistérios entre ser ou não ser mãe do que entre o céu, a terra e a filosofia. Mas não é sobre eles que quero falar. Não é sobre não se identificar com a maternidade por causa de depressão, cansaço e cobranças sociais.

É sobre o parir um ser humano a qualquer custo, sobre a quantidade enorme de mulheres que querem ser "mães", mas, no fundo, apenas pontuam um desejo de parir filhos. Sei que a sociedade embute na mulher a maternidade compulsiva, nos destinando a sermos mães a qualquer custo, sob pena de não ter respeito ou reconhecimento social caso optemos por outro caminho.

É assim em várias religiões e é assim em vários grupos sociais. As mulheres crescem com essa informação de que precisam parir e, quando veem, querem ter filhos, sem refletir exatamente sobre o que a maternidade representa. Muitas confessam que quiseram um filho para completar um casamento, porque acharam que era a ordem natural das coisas, para agradar pais e sogros, melhorar um relacionamento ou mesmo atender a um pedido do companheiro. E hoje são felizes assim.

Há outras que jamais vão expor esses desejos internos ou que nem se conectaram com ele, não se questionaram se querem mesmo ser mãe ou ter filhos. E há aquelas que querem parir para fazer parte de um grande grupo social que é o das mães. Ter um bebê na barriga e nos braços te coloca, superficialmente, em um lugar de respeito. Depois, quando o filho chora, precisa comer, necessita ser formado e educado, todos somem.

A maternidade é braçal, é cheia de esforços e é preciso saber sobre eles. Cuidar, educar, criar, ter empatia, corrigir e mostrar caminhos cansa. E muito. Mesmo nos casos em que o pai é presente, em que há uma conta bancária farta e a rede de apoio é grande, a maternidade é cansativa, é profunda, existencial e nos molda. Nos faz sermos quem jamais imaginávamos que seríamos.

Ser mãe é sobre cultivar um amor incondicional. Ter filhos é sobre colocar no mundo. Ser mãe é sobre ser amiga, companheira e parceira, mas também comandante do destino enquanto aquele ser humano não sabe nada sobre caminhos. Ter filhos é carregar e parir. Ser mãe é sobre alimentar e ser alimento. Ser mãe também é sobre ter filhos, mas não só isso. É sobre ser você em outro ser.

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