O choro de uma criança diagnosticada com transtorno de espectro autista teria sido o estopim de uma tragédia na última sexta-feira (29), em Teresina (PI). Dois morreram e uma mulher ficou gravemente ferida.
A culpa seria do choro, dizem os envolvidos e a polícia. Para mim, intolerância, ignorância e armas de fogo ao alcance das mãos são os verdadeiros culpados.
Em uma sociedade armada e cada vez mais bélica, crianças não podem nem mais chorar. Não que antes pudessem. Nunca puderam, mas armas não eram de fácil acesso. Dificilmente alguém morreria com um tiro porque o filho chorou.
No caso de Teresina, o tio da criança irritou-se com o choro do garoto de quatro anos e foi repreendê-lo. O pai ficou sabendo, não gostou da atitude e, munido com uma faca, procurou o cunhado. Armado, o tio, que era instrutor de tiros, não pensou duas vezes. Disparou.
Seu primeiro disparo acertou a babá, de 36 anos. O segundo feriu o pai da criança na perna —ele morreu após ser socorrido. E um último tiro matou o tio. Esse tiro saiu da própria arma, atingindo-o na cabeça, no que seria um erro dele mesmo.
A criança segue viva, provavelmente traumatizada. Não sei se irá chorar mais ou menos após essa tragédia. Só sei que armas nas mãos de gente errada vão nos levar a mais e mais casos como este.
Penso em como o coração desta mãe deve estar despedaçado. Se já era difícil criar um filho com autismo tendo um companheiro e uma babá, imagine como será agora.
Penso que crianças não podem chorar nunca, sob pena de morte.
Sou contra a facilitação de posse e porte de armas e munição como vem ocorrendo no Brasil. Não há dados e informações que me convençam do contrário. Armas matam e ponto final. São feitas apenas para isso.
O governo atual editou, até o momento, 19 decretos, 17 portarias, duas resoluções, três instruções normativas e dois projetos de lei em prol de armas e munições. Não vi melhorar em nada a situação de crianças, adolescentes, pais e mães com tais medidas.
A dor que se abateu sobre essa família é, hoje, irreparável. Podemos apenas barrar dores futuras em outras famílias. É preciso legislação mais firme contra o armamento para que nossas crianças não sejam ainda mais vítimas de uma sociedade doente, mesmo que de forma indireta.
Criança precisa de respeito, carinho de tio, amor de pai, tranquilidade de mãe. Criança especial merece atenção ainda maior. Nenhuma delas deve ser calada de forma violenta. O barulho dos tiros precisa nos incomodar mais do que o choro de uma criança.
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