É mais difícil criar filhos em tempos atuais. Sei que a frase é polêmica, mas é como me sinto. Quando chegou a minha vez de ter filhos, as demandas para criar seres humanos minimamente saudáveis foram ampliadas.
Além de ter de provê-los do básico para se viver em meio a uma sociedade consumista e violenta, na qual o uso da tecnologia nem sempre é benéfico, as dificuldades foram ampliadas para mães de adolescentes que, como a minha primogênita, estão no ensino médio.
A aprovação da reforma do ensino médio em 2017 já mostrava problemas. Era preciso avançar e não dava para ficar onde estávamos, mas o debate feito em meio a uma sociedade dividida, após um processo de impeachment, não foi amplo o suficiente para o tamanho da mudança.
Depois, próximo ao período de implantação do novo método, que começou a valer em 2022, estávamos vivendo uma pandemia que, no Brasil, bateu recordes de contaminação e mortes. Vivemos aqui em nossa terra horror triplo: medo de morrer, negligência na compra de vacinas e deboche em cima de cadáveres e da falta de ar de pacientes.
Não houve preparação como deveria. No ano passado, as mudanças foram implantadas e o caos formou-se, como mostrou reportagem da Folha que aponta escolas estaduais oferecendo 1.526 disciplinas no novo ensino médio.
Nesse meio, estão os estudantes do ensino médio. Exaustos da pandemia, confusos, vivendo as mudanças da adolescência, com hormônios à flor da pele e sentindo-se ainda mais desamparados do que a fase em si já os faz sentir.
Como todo ser humano, estudante tem mãe. Que, por tabela, está exausta, confusa, vivendo a mudança hormonal dos filhos e tentando retomar a vida pós-pandemia sem o mínimo de sanidade mental. Sem contar as que estão desempregadas e as que se separaram e viram os pais das crianças separarem-se dos próprios filhos, ou tudo isso junto.
A reforma deu errado, como quando tentamos fazer um ajuste em nossa casa e não contratamos especialista visando economizar. O remendo —se vier (e espero que venha)— vai sair caro, porque está custando anos primorosos da vida de nossos filhos e a sanidade mental de estudantes e suas famílias.
Os itinerários formativos, em vez de ajudar, trazem ainda mais confusão sobre a profissão que o aluno precisa escolher. A situação política que deu voz à extrema-direita tem feito com que pais interfiram ainda mais na rotina escolar, com pautas retrógradas e intolerância.
As regras do novo ensino médio ficam bem no papel. Na prática, são falhas. A carga horária não foi ampliada em todas as escolas, mas o número de disciplinas, sim. São mais temas para "estudar" e se aprofundar, sem uma orientação clara de qual rumo a sociedade quer dar para o futuro desses alunos.
No dia 1º de janeiro, posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), minha primogênita, na época com 15 anos, me fez um pedido enquanto acompanhávamos pela TV a cerimônia: "Mãe, será que você não pode falar para o presidente Lula acabar com esses itinerários?", em uma certeza de que mãe é porto seguro.
O pedido de ajuda de minha filha soou para mim como a voz de muitos estudantes que têm tomado as ruas em manifestações contra o novo ensino médio. Querem ser ouvidos, respeitados e acolhidos. É o mínimo.
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.