Conrado Hübner Mendes

Professor de direito constitucional da USP, é doutor em direito e ciência política e membro do Observatório Pesquisa, Ciência e Liberdade - SBPC

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Conrado Hübner Mendes

Guia prático para defender o STF

Se ministros não ajudam tribunal a sobreviver, ajuda externa não vai bastar

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Bolsonaro reitera toda semana a intenção de fechar o STF (e o Congresso, as investigações de corrupção, as liberdades civis etc.). Era o que pediam apoiadores que chutavam jornalistas e agrediam profissionais de saúde na frente do Palácio do Planalto. Até profissionais de saúde. Numa pandemia.

“Fechar”, você sabe, é uma metáfora. O novo AI-5 é uma metáfora. Os meios operam nas sombras enquanto o bufão nos ofende e nos furta a serenidade. A leitura do que se passa exige mais atenção. Os tempos são outros e nos porões já se veste terno e gravata.

O tribunal vai fechando enquanto ministros cantam suas virtudes e asseguram não haver risco de ruptura. O tribunal vai fechando enquanto esperamos o cabo e o soldado. A Polícia Federal acabou de fechar e poucos notaram. Rio das Pedras celebrou. A Procuradoria-Geral da República fechou faz tempo. Ibama e Funai fecharam.

É preciso proteger o STF contra as ameaças de uma pessoa pública infame que há 30 anos viola a lei sem maiores consequências. Aprendeu tão bem que, na Presidência, comete crimes comuns e de responsabilidade. Mas também é urgente defender o STF de alguns dos ministros e seus maus costumes.

Bolsonaro não pode abrir mão de um tribunal, desde que fraco e servil. Um tribunal que Dias Toffoli se dispôs a entregar quando rabiscou em poucas linhas o retorno à “clássica separação dos Poderes”, uma teoria cheia de garranchos que lhe autoriza a frequentar bastidores do Planalto e negociar constitucionalidade. Resolver “pelo diálogo”, como diz.

Um guia prático para defender o STF é, entre outras coisas, um guia de bom comportamento para ministros do STF. Bom comportamento não é só mandamento de ética judicial, é estratégia de sobrevivência. E sobreviver não é deferir à vontade dos outros, é reforçar cada vértebra do projeto constitucional.

Alguns ministros perdem a democracia mas não perdem a chance de soltar uma monocrática; de palestrar sobre segurança jurídica e contribuir para um tribunal promotor de insegurança; de palestrar em defesa das reformas quando lhes cabe apreciar a constitucionalidade das reformas; de oferecer opiniões privilegiadas em eventos com empresários interessados nas posições do STF; de confundir a instituição judiciária com a corporação magistocrática.

Fosse só violação da ética judicial, seria muito grave. Só que é também imprudência política. A promiscuidade e a vocação monocrática reduzem a capacidade de o tribunal se fazer respeitar, mesmo quando acerta.

O país precisa conhecer a opinião do STF, não do ministro fulano ou beltrano. Não são a mesma coisa. Essa contenção individual não se confunde com contenção do tribunal, que deve interferir o quanto for juridicamente exigível. E não banalizemos a expressão “ativismo judicial”, um conceito vazio que mais atrapalha do que ajuda na análise do tribunal.

Entrar em modo emergência começa por aí: despersonalizar a corte. Isto é, tratar o colegiado como regra, não como exceção. E a agenda do colegiado não pode pertencer ao arbítrio do presidente da corte, mas a um procedimento também colegiado.

Errar e acertar é da vida das instituições. O boicote contumaz à autoridade do tribunal, não. Exceto das instituições suicidas. Difícil perdoar ministro que põe tudo a perder na tentativa de matar no peito e resolver sozinho, nessa lógica obtusa pela qual o STF vem funcionando há anos.

Vão esperar o cabo para disparar o alarme? Ou só quando o soldado chegar para trancar a porta? “Cabo e soldado” é figura de linguagem que se refere a vocês mesmos, ministros. Aqui de fora, muitos tentam ajudar. Ajudar a corte é a parte que lhes cabe.

Nem sempre a força respeita o que a lei proíbe. Foi o que Bolsonaro quis dizer quando falou que vai “cumprir a Constituição a qualquer preço”. Mais um aviso. “A Constituição sou eu.” Precisa ser mais claro?

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