Conrado Hübner Mendes

Professor de direito constitucional da USP, é doutor em direito e ciência política e membro do Observatório Pesquisa, Ciência e Liberdade - SBPC

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Descrição de chapéu Folhajus STF

Ministros do STF são insuspeitos, dizem ministros do STF

Luiz Fux promete um novo tribunal, um tribunal menos Gilmar Mendes

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O comportamento de ministros do STF tem lugar especial em manuais de ética judicial e etiqueta pública —o lugar do contraexemplo. Ensinar o que não fazer é vocação praticada com persistência por essa geração de ministros. Tirem as crianças da sala, tirem os bacharéis da sala de aula de direito, os ministros do STF vieram falar de honorabilidade institucional e imparcialidade. E de segurança jurídica.

O STF está acima de qualquer suspeita. Assim entendem os ministros do STF. Desde 1988, dos 111 casos de questionamento da suspeição de ministros, arquivaram-se todos. Em parte deles, o regimento foi desobedecido e a decisão monocrática do presidente sequer passou por plenário (“Fora dos Holofotes: estudo empírico sobre o controle da imparcialidade dos ministros do STF”, de autoria de Glezer, Guimarães, Ferraro e Barbosa).

Se números sozinhos são insuficientes, vale citar condutas que seguem liberadas, a começar pela mais grotesca do tribunal.

Gilmar Mendes acusou Luiz Fux, dias atrás, de criar “eine grosse Konfusion”. Não sei você, mas aos meus ouvidos soa mais potente que “uma grande confusão”. Eu diria o mesmo sobre a ideia de imparcialidade praticada por Gilmar. No seu modelo canastrão cosmopolita, “la garantía soy yo”: sou imparcial porque estou dizendo que sou imparcial, porque sou Gilmar.

Espera-se que juízes sejam imparciais, mas não há como assegurar imparcialidade subjetiva. Pode-se apenas zelar pela imagem de imparcialidade, a imparcialidade objetiva. Regras reguladoras de conflito de interesses e suspeição buscam cumprir essa tarefa, não reformar o caráter de ninguém. Rituais de imparcialidade são tributos obrigatórios que se pagam à instituição, não importam honestidade ou estado de espírito do juiz.

Gilmar Mendes induz sua “grosse Konfusion” sobre essa distinção elementar e ignora regras que protegem a imagem de imparcialidade. Mesmo quando mata na origem, por decisão monocrática, em desrespeito a precedente do colegiado do STF, investigações criminais contra os amigos José Serra e Aécio Neves, ou quando julga interesses do escritório da esposa, jura que é imparcial. Finge que a pergunta foi sobre qualidade de caráter, não sobre respeito a regras.

O STF ainda nos deve opinião sobre a imparcialidade de Sergio Moro. Tudo que Moro fez foi cooperar com o trabalho acusatório e midiático do Ministério Público e festejar a Lava Jato em eventos com Aécio, Alckmin, Doria, Serra e Temer. Aceitou virar ministro do governo que se elegeu na esteira de sua obra. Nada demais, pois Moro sempre nos garantiu ser homem honrado. Por que um tribunal de insuspeitos demora tanto em julgar a insuspeição de Moro?

Luiz Fux assumiu a presidência sob promessa de reformas. Disse que o STF será “desmonocratizado” para que “decisões sejam sempre colegiadas em voz uníssona”. Já mudou regimento para prevenir a chicana da distribuição de processos a ministros específicos e assim neutralizar táticas dos amigos de ministro.

Por alguma razão, optou por não votar emenda que atacaria a patologia das liminares monocráticas por meio da exigência de referendo do colegiado. Seria um pequeno passo para o STF, mas um grande salto para sua dignidade. Em nome dessa dignidade, Fux impediu que Kassio Nunes herde relatoria da investigação sobre Jair Bolsonaro e mandou redistribuir o processo.

Kassio desafiou o requisito de “notório saber jurídico” pelo plágio, e respondeu à exigência de “reputação ilibada” pela negação do plágio. Mas nem precisamos duvidar de suas capacidades intelectuais e morais para concluir que não deveria ser relator do caso que afeta interesses pessoais do presidente que o nomeou.

Hoje o Senado fará perguntas a Kassio. Estou menos curioso com o que pensa sobre questões constitucionais e mais interessado em escutar sua visão sobre suspeição e conflito de interesses, decoro e imparcialidade, pedido de vista e obstrução. Sobre as primeiras, não dirá mais que platitudes ensaiadas. Sobre ética judicial, senadores poderiam ao menos pedir compromissos concretos.

Não é muito, mas ajuda a colocar ética judicial na ordem das preocupações públicas.

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