Daniel Furlan

Ator, comediante e roteirista, é um dos criadores da TV Quase, que exibe na internet o programa "Choque de Cultura".

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Descrição de chapéu

Humanos fantásticos - Parte 4

Percebendo que a sensatez não era obstáculo para nos deter, fomos convidados para conversar em sua casa

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Saindo praticamente fugidos do artesanato ostensivo da casa/ateliê de Luís, na rua demos de cara com Jarbas, um artesão com uma ferida horrível na mão e unhas imundas onde ele testava pessoalmente as lixas que tentou nos vender. Aproveitamos a situação para conseguir ajuda na nossa busca pelo(s) último(s) hippie(s), o que ele prontamente lincou ao pescador local que namorou Janis Joplin, mas que agora morava num acampamento do MST a 50 km dali, tendo ficado “meio doido”, além de casado com uma mulher que não gostava de gente perguntando sobre Janis Joplin. Percebendo que a sensatez não era obstáculo suficiente para nos deter, fomos convidados para conversar em sua casa.

O local era afastado, uma espécie de subúrbio da aldeia hippie, que já é uma região periférica de Arembepe, que por sua vez é um vilarejo praiano da pequena Camaçari. Chegamos num surreal minicomplexo de cabanas que parecia uma vila de gnomos e fomos apresentados ao dono de fato, Jairo, irmão de Jarbas. 

Jairo foi o primeiro a não nos pedir nada e inclusive não vendia artesanato porque não queria “ter que ficar correndo atrás de dinheiro”. Hippie demais até para o artesanato? Na verdade ele nutria um desprezo por todos os assuntos relacionados à prefeitura, eletricidade ou civilização. O fato era que todos os habitantes, aos olhos de Jairo, estavam “mancomunados com a prefeitura”. Não considerava seu irmão Jarbas hippie tampouco, apenas um viajante. Afastou-se da aldeia porque era estresse demais, um lugar onde “todos têm luz elétrica” —que ele tinha vontade de destruir. Também demonstrou um profundo desdém pelo rapaz que namorava Janis Joplin, por se tratar apenas de um pescador que nem morava ali.

Mudou de assunto bruscamente porque estava “bolando a cabeça” com uma matéria sobre cultivo de olhos com células tronco, da revista Scientific American. Jairo foi o único a se apresentar como tudo o que procuramos, o último hippie do mundo, e por isso mesmo o descartamos. Esforçava-se demais para 
parecer legítimo.

Quando partirmos, nos saudou com um cumprimento hippie absurdo e nos desafiou a achar alguém na aldeia que o soubesse. E, como tudo o que faz muito sentido provavelmente é mentira, seguimos nossa busca. (Continua)

Colaborou Cynthia Bonacossa

 

Ilustração
Cynthia Bonacossa - Cynthia Bonacossa/Folhapress

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