Deborah Bizarria

Economista pela UFPE, estudou economia comportamental na Warwick University (Reino Unido); evangélica e coordenadora de Políticas Públicas do Livres

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Deborah Bizarria

Mulheres precisam se ver com a mesma confiança do homem branco

Empresas têm de perceber que confiança não é a mesma coisa que competência

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Neste mês em que comemoramos o Dia da Mulher, o governo já anunciou um projeto de lei sobre igualdade salarial entre homens e mulheres que dificilmente solucionará a disparidade, como eu e outros especialistas apontamos. Parte dessa diferença se dá pelo peso da maternidade e pelas normas sociais ligadas ao cuidado com os filhos, questões que já vêm sendo endereçadas em outros países por políticas públicas como melhoria do acesso a creches, licença parental compartilhada e exposição das mulheres a disciplinas tradicionalmente masculinas na escola. Porém há uma outra causa para disparidade que ainda carece de propostas: a diferença de autoconfiança entre homens e mulheres.

Para entender os níveis de autoconfiança em comparação com as habilidades, os pesquisadores Joyce Ehrlinger e David Dunning decidiram conduzir um experimento através de um teste sobre raciocínio científico e questionários sobre sua própria competência no tema. Na autoavaliação, as mulheres avaliaram-se mais negativamente do que os homens; elas deram a si mesmas 6,5 em média, e os homens, 7,6, numa escala de 1 a 10. Após o teste, as mulheres acharam que acertaram 58% das perguntas, já os homens 71%. Apesar da clara distinção de autopercepção, os resultados do teste de conhecimento foram muito próximos: a taxa de acertos para mulheres e homens foi respectivamente 75% e 79%.

Pode-se pensar que a diferença de autoconfiança não necessariamente teria impacto real, já que a competência é tão parecida. Para sanar essa dúvida, esses mesmos pesquisadores convidaram os alunos para uma competição de ciências com premiação —sem revelar os desempenhos nos testes de conhecimento. Uma proporção significativamente menor de mulheres optou por participar, com apenas 49% delas se inscrevendo, em contraste com 71% dos homens. Ou seja, a falta de confiança nas próprias habilidades levou as alunas a não se arriscarem na competição pelo prêmio.

Ainda na linha de entender como traços de personalidade afetam salários, Leonora Risse, Lisa Farrell e Tim Fry analisam dados de renda e personalidade dos australianos. A sua análise indica que os homens sugerem ter um nível mais alto de autoconfiança, maiores crenças na própria capacidade de sucesso, menor medo de fracasso e menor amabilidade. Essas características estão todas ligadas a salários mais altos. Ao mesmo tempo, o único traço de personalidade que parece dar às mulheres uma vantagem em termos de salário é seu maior nível de diligência e cuidado com o trabalho e com a equipe. Esses resultados apontam que é possível que as mulheres acabem optando por confiar mais na competência em seu trabalho atual do que se arriscar a buscar trabalhos mais desafiadores de modo proativo —ainda que tenham a competência necessária para novos desafios.

Ou seja, não é falta de competência ou de experiência que pode fazer com que mulheres não busquem empregos com melhores remunerações. Muitas vezes é uma questão de falta de confiança no próprio talento. Mas há algumas ideias iniciais sobre como lidar com o problema. Barbara Carlin e outras pesquisadoras reuniram experiências no setor privado e evidências na literatura de construção de confiança. Entre as soluções, há sessões de feedback específico sobre projetos, oportunidades de mentoria, aulas e webinars sobre como falar em público —todos têm impacto sobre a autoconfiança.

Além disso, as autoras apontam na direção de mudanças organizacionais na gestão das empresas. Perceber que confiança não é a mesma coisa que competência, premiando os colaboradores de acordo com entregas reais e não se deixando levar pelas aparências, além de favorecer a produtividade ajuda no avanço das mulheres. Nas empresas em que as medidas forem implementadas, as organizações podem se beneficiar de talentos e liderança em potencial que sem algum ganho de confiança não poderiam ser usados antes, ou seja, há ganhos de eficiência de capital humano.

Similarmente, aumenta a atratividade para novas contratações em potencial entre as mulheres que irão avaliar o quão bem a organização atualmente utiliza os talentos e a liderança das mulheres.

O desafio para pesquisadores e formuladores de políticas públicas é incorporar as evidências sobre a diferença de confiança em programas educacionais para garantir um melhor aproveitamento do capital humano das mulheres.

Enquanto novos estudos e novas ideias surgem, vale o lembrete às leitoras: não duvide das suas habilidades.

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