Desigualdades

Editada por Maria Brant, jornalista, mestre em direitos humanos pela LSE e doutora em relações internacionais pela USP, e por Renata Boulos, coordenadora-executiva da rede ABCD (Ação Brasileira de Combate às Desigualdades), a coluna examina as várias desigualdades que afetam o Brasil e as políticas que as fazem persistir

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Desigualdades
Descrição de chapéu Dia da Consciência Negra

Apesar de avanços, caminho é longo para oportunidades iguais nas eleições

Mulheres negras são mais de 28% da população, mas 6,3% dos vereadores eleitos

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Anielle Franco

É cria da favela da Maré, no Rio de Janeiro e mestra em Jornalismo e Inglês pela Universidade de Florida A&M. Atualmente é mestranda do Cefet-RJ, cursando relações étnico-raciais. Trabalha como professora, palestrante, escritora e é a atual diretora do Instituto Marielle Franco, curadora do Projeto Papo Franco e do curso Marielles

No Brasil de 2020, temos acompanhado muitos debates sobre o racismo estrutural e suas consequências, tenham sido eles impulsionados por uma pandemia global como a que estamos passando ou pelo introjetar da frase “eu não consigo respirar”, simbolizando o sopro da vida de negros e negras. Nesta coluna, optei por refletir sobre os resultados das eleições de 2020, marcadas pela conjuntura do vírus, das desigualdades e do racismo.

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) divulgou na sexta-feira (20), Dia da Consciência Negra, a análise racial do resultado do pleito deste ano. Em primeiro lugar, é importante lembrar que, talvez em consequência das decisões recentes do TSE e do Supremo Tribunal Federal (STF) de estabelecer divisão proporcional de recursos para as candidaturas negras, estas eleições tiveram a maior proporção e o maior número de candidatos negros já registrados pela corte eleitoral brasileira. O número de candidatos que se declararam pardos e pretos foi de 50,04%, superando os 46,56% das eleições de 2018 e os 47,76% do pleito de 2016. Das 536.840 candidaturas registradas no país, 33,6% foram de mulheres, e mais da metade de pretos e pardos.

Anielle Franco, irmã de Marielle Franco
Anielle Franco, irmã de Marielle Franco - Zô Guimarães - 11.mar.20/Folhapress

A maior presença de candidaturas de negros e negras refletiu-se no resultado das urnas. De acordo com o TSE, mais de 40% das candidaturas negras (pretas e pardas) foram eleitas, sendo 1.730 para o cargo de prefeito/a. Já para o cargo de vereador/a, foram eleitos 25.960 negros/as, cerca de 10% do número total de candidaturas registradas, um aumento de 2% em relação a 2016.

Ainda assim, mesmo sendo proporcionalmente maior o número de candidaturas negras, foram pessoas brancas que mais conquistaram a vaga de vereador/a: serão 54% nas câmaras municipais no ano que vem, enquanto pessoas negras ocuparão 44% das cadeiras. O número representa um aumento de dois pontos percentuais em relação a 2016, mas permanece bem abaixo da proporção de negros e negras na população em geral: 56%. Ou seja, apesar dos avanços, o caminho é longo quando falamos de oportunidades iguais na disputa eleitoral.

Cabe aqui também pontuar que o traço central das desigualdades eleitorais repousa não só sobre a raça, mas também e —principalmente— sobre a questão de gênero. No Brasil de 2020, as mulheres representam 52,5% do eleitorado brasileiro, mas o número de vereadoras eleitas representa 16% do total, apenas 9.000 contra os 47,3 mil de homens que estarão no Legislativo municipal no ano que vem.

Quando olhamos para as mulheres negras, esse cenário se agrava: somos mais de 28% da população brasileira segundo os dados da PNAD, mas apenas 6,3% dos vereadores eleitos nestas eleições são mulheres negras. Os números são ligeiramente melhores do que a configuração atual de nossas câmaras municipais, eleitas em 2016, que contam com 13% de mulheres, sendo 5% mulheres negras.

Em nossa Agenda Marielle Franco, lançada pelo Instituto que dirijo e que leva o nome de minha irmã, projetamos um outro futuro para o país. Foi uma longa caminhada reunindo os projetos de lei da Mari, analisando a sua atuação como vereadora e presidenta da Comissão da Mulher da Câmara Municipal e escutando suas assessoras. O nascimento dessa ferramenta, um conjunto de pautas e práticas antirracistas, feministas e populares a partir de seu legado, foi responsável por mobilizar mais de 700 candidaturas de todo o Brasil comprometidas com os princípios e políticas de Marielle. Destas, 82 foram eleitas, sendo 58% de mulheres negras.

Ter mais mulheres negras eleitas era a história e missão de minha irmã, e agora, tornou-se um legado importante a defendermos. O resultado da Agenda Marielle é uma visão de futuro com políticas que visam o combate às desigualdades de raça, gênero e classe, onde nossos corpos estejam representados nos espaços de tomada de decisão deste país. O futuro antirracista é feito no agora, sob nossa liderança e com uma rede de apoio que impulsiona o movimento definitivo das estruturas que impedem nosso povo de respirar no Brasil.

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